Identidade

Por muita tolerância e paciência que possa ter, por muito que queira acreditar que esta fase de jogos não é, nem nunca foi, condicionante do futuro, por todo o amor que possa ter a este Clube, não consigo livrar-me desta apreensão e tristeza que me assaltam a cada dia que leio, vejo ou falo do futuro, da época que está prestes a começar, não esquecendo os fantasmas de estimação, claro.

Se a ansiedade e saudade de percorrer  kms atrás do nosso amado Benfica são imensos, os medos e as duvidas acompanham-me, não me dando sossego. Estes só serão apaziguados quando me fizer ao asfalto da estrada, levando no coração a chama imensa. Que comece rápido. Para o bem ou para o mal, embora nunca esteja preparada para o mal, sobretudo quando se trata do Benfica, mesmo que a minha razão trave um incansável braço de ferro com o coração... É o Benfica!

A questão é se farei muitos ou poucos kms. A questão é até onde a minha razão conseguirá perder este embate.

O quanto eu queria fazer muitos kms. 

O quanto eu queria andar a fazer contas à vida para definir o que não poderei fazer para poder ir ver o Benfica. 

O quanto eu queria ouvir sermões pelos encontros com amigos e até reuniões de familia que deixarei de estar presente por estar na Catedral ou noutro estádio qualquer desse país com o Benfica. 

O quanto eu queria ter dores de cabeça a trabalhar mais horas, a trocar esta ou aquela folga para poder ir ver o Benfica.

O que não queria mesmo ver e sentir é o que tenho vindo a assistir. A cada dia que passa um grão da nossa identidade se esvai.. O pior de tudo é não ver nem sentir ninguém a impedir que tal aconteça. Pelo contrário. Só podemos preservar e lutar por algo pelo qual tenhamos amor e/ou sentido de pertença, identificação. Esse sentimento só o vejo entre nós mas é um sentimento que a reboque traz a inércia, a incapacidade de não deixar que o mesmo não nos seja tomado e violentado como tem vindo a ser. Nem roubado é, já que tal implica o uso da força. 

Estamos presentes sempre, a cada chamada, a cada passo. Pelo Benfica. O que servimos, conscientemente, é o Benfica. 

Mas, inconscientemente, não vejo que assim seja. Andamos a servir e a ser coniventes com este total desnorte e descredibilização do que foi e devia ser a Instituição Sport Lisboa e Benfica por permitirmos que os seus pergaminhos não sejam cumpridos e respeitados com o nível de exigência com que o deviam ser.

Antes de qualquer outro, acima de qualquer outro, estamos nós. Porque o Benfica, até ver, somos nós. A responsabilidade, antes de qualquer outra, é nossa e não estamos a cumpri-la,  porque se estivéssemos, não haveria receios, não existiriam desrespeitos, não sentiríamos tristeza nem vergonha com cada vez maior número de actos que em nada se identificam com a índole Benfiquista, nem nos deixaríamos invadir pela descrença e divisão.

A identidade não se perdia como se tem vindo a perder, de época para época, de dia para dia, de comunicado para comunicado, de noticia para noticia e, sobretudo, de adepto para adepto. 

A necessidade premente de títulos não justifica tudo, muito menos poderá resolver tudo.

Muitos dizem que recuperamos a credibilidade.. Qual credibilidade? A do euro? A nossa identidade não devia ter preço. Eu sempre acreditei que não tinha mas a velha máxima de que "tudo tem o seu preço" parece não ter excepção. Nem o meu Benfica, refém de quem a serve, com a conivência daqueles a quem pertence ou devia pertencer. Nós. 

Sejam felizes e amem o Benfica, a única coisa que nunca poderá ser corrompida é este nosso amor. Não deixem que o acorrentem e o manietem porque todo e qualquer amor só pode ser livre. É contra natura que assim não seja.

Como alguém me dizia ainda há pouco tempo, tudo na vida é um ciclo excepto este sentimento que é imutável. O meu ciclo, enquanto escriba do Ontem, termina mas levo-vos no coração. O que o Benfica uniu jamais poderá ser separado :)

Um muito obrigada a todos e Viva o Benfica! 

Marta Mesquita