Há a tentação de muitos "gestores" de analisarem os clubes de futebol / SADs e mesmo empresas em geral olhando apenas para o EBITDA. A verdade é que o EBITDA - Earnings before interest, taxes, depreciation and amortization ("Ganhos" antes de juros, impostos, depreciações e amortizações), é um indicador popularizado para avaliar o cash-flow libertado pela actividade operacional de um clube, mas na verdade pouca informação revela sobre a actividade desse mesmo clube.
Ao olhar para estes valores poderíamos pensar que a Benfica SAD libertava muitos fundos e como tal não teria grandes problemas com a sua gestão de tesouraria. Então qual a justificação para o crescente endividamento baseado na necessidade de investimento em jogadores, conforme vem indicado nos relatórios da Benfica SAD ?
Conforme verificámos anteriormente, de 2008-09 para 2011-12, o passivo oneroso do Benfica (seja a SAD ou o Grupo) aumentou significativamente apesar do EBITDA indicar que existe consistentemente uma libertação de fundos gerada pela actividade em especial nas duas últimas épocas. Qual a razão então deste aparente contra-senso ?
O Resultado Operacional excluindo operações com jogadores, corresponde à diferença entre as receitas operacionais, aquelas que estão directamente ligadas com a actividade da SAD (bilheteira, quotização, transmissões televisivas, prémios desportivos (UEFA), publicidade, patrocínios e merchandising, etc.) e as despesas operacionais (custos com pessoal, fornecimento de serviços externos tipo segurança, viagens, seguros, despesas de publicidade e marketing, combustíveis, etc. amortização de equipamentos, etc.), ou seja, é aquilo que a empresa gera com a sua actividade normal.
Para passarmos do Resultado Operacional excluindo operações com jogadores, ou seja, o valor que é gerado pela actividade normal, ao EBITDA, vamos somar as mais-valias das vendas dos passes dos jogadores e diminuir as amortizações com o equipamento e as provisões para dívidas incobráveis, ao ROeop.
EBITDA = ROeop + Mais-valias de vendas de jogadores - Amortizações - Provisões.
Na verdade, juntam-se as receitas com as alienações dos passes dos jogadores, enquanto que os valores gastos com aquisições de jogadores não são considerados, por isso até mesmo quanto à libertação de fundos da actividade operacional o indicador pode enviesar significativamente a apreciação, ou seja, apenas contabiliza as vendas em cima da actividade do dia-a-dia e omite as saídas de dinheiro necessárias para se adquirirem jogadores.
Mas não omite só as saídas de dinheiro com aquisições, esquece ainda os encargos financeiros, que são muito importantes na estrutura de custos dos clubes/SADs e são um dos exfluxos mais relevantes em termos de tesouraria com que um clube/SAD se depara, tanto mais que muitos dos empréstimos são "permanentes", tantas as vezes que o revolving das operações são feitas.
EBITDA = ROeop + Mais-valias de vendas de jogadores - Amortizações - Provisões.
Na verdade, juntam-se as receitas com as alienações dos passes dos jogadores, enquanto que os valores gastos com aquisições de jogadores não são considerados, por isso até mesmo quanto à libertação de fundos da actividade operacional o indicador pode enviesar significativamente a apreciação, ou seja, apenas contabiliza as vendas em cima da actividade do dia-a-dia e omite as saídas de dinheiro necessárias para se adquirirem jogadores.
Mas não omite só as saídas de dinheiro com aquisições, esquece ainda os encargos financeiros, que são muito importantes na estrutura de custos dos clubes/SADs e são um dos exfluxos mais relevantes em termos de tesouraria com que um clube/SAD se depara, tanto mais que muitos dos empréstimos são "permanentes", tantas as vezes que o revolving das operações são feitas.
Para percebermos o peso crescente da estrutura de financiamento, olhemos primeiro para o crescimento dos custos financeiros líquidos, ou seja a diferença entre custos financeiros e proveitos financeiros.
Como é fácil de compreender, o valor dos custos de financiamento da Benfica SAD tem vindo a subir constantemente ao longo dos anos.
Mas mais importante que olhar apenas para os valores dos custos financeiros é perceber como tem variado o peso face às receitas. Neste caso, convém explicar que os dados utilizados dizem respeito aos valores da Benfica SAD consolidados, tanto em termos de receitas como de custos financeiros sendo que as receitas incluem as transferências de jogadores.
Mas mais importante que olhar apenas para os valores dos custos financeiros é perceber como tem variado o peso face às receitas. Neste caso, convém explicar que os dados utilizados dizem respeito aos valores da Benfica SAD consolidados, tanto em termos de receitas como de custos financeiros sendo que as receitas incluem as transferências de jogadores.
Novamente convém referir que enquanto as barras representam os valores absolutos (milhões de euros), a linha deve ser lida no eixo dos valores relativos (%) visto tratar-se da relação entre as duas ordens de grandeza. Para quem pensa que se os valores seriam significativamente diferentes se fossem utilizados os valores individuais da SAD estão enganados, pois em termos percentuais as linhas praticamente se sobrepõem sendo que apenas em 2009-10 há uma diferença de um ponto percentual.
Isto quer dizer que apesar das receitas crescerem, a verdade é que a taxa de crescimento dos encargos financeiros foi mais elevada, o que leva a que hoje em dia o peso dos custos de financiamento nas receitas tenha aumentado sensivelmente.
Convém referir que a opção pela inclusão das transferências de jogadores, tem na sua base o facto de as transferências assumirem cada vez mais um carácter permanente e não um carácter extraordinário e com o facto de o endividamento estar associado ao grande investimento efectuado no plantel pela Benfica SAD nos últimos anos.
A análise ao passivo oneroso do Benfica, mostra que o passivo está cada vez mais concentrado a menos de um ano, passivo corrente, ou seja, existe uma exigibilidade maior em relação a este passivo o que pode constituir um risco para a tesouraria, mas mais que isso, retirará ao Benfica capacidade de decisão. A contratação de jogadores, mesmo sendo cada vez mais diferidos os prazos de pagamento pelas transferências, estará limitada não pelos novos compromissos a assumir, mas antes pelos compromissos já assumidos que exigem que a aplicação da tesouraria seja desviada para amortização de dívidas.
Mas pagar as dívidas e diminuir o passivo oneroso não é bom ? É bom e desejável, mas o problema estará na limitação dos graus de decisão. Imaginemos que faltará um jogador para completar o plantel, seja ele para titular, seja para jogador de rotação, tipo um central, ou um lateral direito ou esquerdo, ou mesmo um médio de características mais defensivas ou de transição. Estas são as posições que normalmente são referidas pelos adeptos.
Imaginemos até que o Jorge Jesus informa a Administração da SAD que necessita desse jogador para conquistar o título. O facto de os recursos estarem todos direccionados para a amortização do passivo oneroso implicará que a Administração da SAD por muito que queira ou reconheça essa mesma necessidade, não a poderá satisfazer. É claro que isto são cenários hipotéticos, mas o que não é hipotético é a limitação com que a SAD se vê devido à necessidade de reembolsar 90 milhões de euros em empréstimos obrigacionistas durante a época 2012-13, nomeadamente 50 em Dezembro de 2012 (já aconteceu) e mais 40 em Abril de 2013.
Em resumo, poderemos dizer que as receitas da actividade operacional e as vendas não têm chegado para as despesas operacionais mais os encargos financeiros e os investimentos na equipa, pelo que tem sido necessário recorrer ao financiamento bancário (passivo oneroso) para manter o funcionamento. Mais ainda, as opções de investimento na equipa de futebol durante as épocas de 2008-09 a 2011-12 originaram que em 2012-13 a Benfica SAD esteja condicionada para levar a cabo um desinvestimento no plantel de futebol e para a amortização do passivo oneroso.
Nos próximos posts abordarei a temática das receitas, as opções estratégicas e as grandes decisões que têm que ser tomadas até ao final desta época.
9 comentários:
B Cool, não te querendo tirar o mérito que tens em lançar este importante debate sobre o nosso Clube, deixa-me dizer-te que a tua análise de um ponto de vista financeiro tem erros graves, embora as conclusões possam não sair afectadas.
As amortizações e provisões não entram no cálculo do EBITDA, muito menos as mais-valias com vendas de passes.
- EBITDA, como bem dizes, quer dizer Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortizations. As amortizações (o "A" do EBITDA) só são retiradas depois, numa folha de demonstração de resultados.
- A venda de jogares corresponde a uma alienação de activos, pelo que não faz parte da actividade operacional do clube e, logo, do EBITDA. A mais-valia com vendas de jogadores só é relevante então para o Resultado Líquido, uma vez que contabilisticamente é considerado como um evento "não-recorrente".
- Por outro lado, a razão pela qual as compras de jogadores não entram para efeitos de resultados tem que ver com o facto destas representarem um investimento num activo (em gíria financeira Capital Expenditures - Capex), o qual se espera reproduza retornos futuros (mais-valias). Como tal, só têm repercussões a nível de balanço e fluxos de cash-flow (caixa).
Não quero pôr em causa a tua análise, mas quando abordamos estes temas penso que é importante sermos o mais rigorosos e transparentes possível.
Na minha opinião, os custos financeiros são o motivo de maior preocupação e o seu controlo deverá ser uma prioridade para a Direcção, sob ameaça de poderem hipotecar o futuro desportivo do clube.
Um abraço
Mais um post fundamental no entendimento do que tem sido e é a gestão do actual Benfica. Obrigado B Cool.
O financiamento bancário tende a ser feito com prazos mais reduzidos que há poucos anos atrás a esta data, o que implica uma ginastica financeira imensa quanto a liquidez, uma vez que geralmente são renovados com o correspondente pagamento de juros a taxas que também já não são propriamente comparáveis com as de 3/4 anos atrás.
Temporalmente as datas dOs pagamentos entre entidades aumentam mas o mesmo não acontece com o pagamento de responsabilidades bancarias - liquidação ou amortização - que seguem a linha temporal oposta face ao considerável aumento do risco nos últimos anos ditado pela situação económica que já conhecemos.
Uma bola de neve que, para ser controlada, implica sacrifícios e esses já sabemos onde se reflectem.
Estes sacrifícios têm que ser minimizados por entradas de dinheiro "novas". Patrocínios e acordos novos, além fronteiras. O Benfica a nível nacional para além de não haver Empresas que possam dispender elevadas quantias nestas rubricas, as que existem com as quais já temos acordos, estes foram celebrados a um prazo excessivamente longo, não permitindo muitos deles contribuir para injecções de capital no prazo desejado..
Dás-me um nó com os teus posts B :)
Mas gosto tanto que até ao almoço acabo por não desligar e almoçar sossegadinha!
@Anónimo,
~
Onde disse que as amortizações e os encargos financeiros entram no cálculo do EBITDA ? Por acaso notaste reparaste na igualdade escrita no texto ? É precisamente por não entrarem que eu recuso que o EBITDA seja uma boa medida de avaliação dos resultados.
Quanto à alienação de passes de jogadores, se achas que não estão incluídas, estás profundamente enganado, aconselho-te a que leias análises internacionais sobre gestão desportiva para perceberes que sim, as alienações entram no cálculo do EBITDA.
Mas tens razão, a aquisição de jogadores não entra no EBITDA, ou seja, inclui vendas, mas não aquisições, tanto que os custos das aquisições são descontados em função dos anos de contrato através das amortizações dos passes.
Ora se o EBITDA não contabiliza nem as amortizações, nem as aquisições, mas contabilizas as vendas de jogadores, não concordas que dá uma visão enviezada da liquidez gerada ?
@Auditor,
Desculpa mas não vi a designação de auditor e por isso apelidei-te de anónimo.
Olá B Cool,
Não sei quem defende o EBITDA como indicador adequado dos resultados, eu não defendo certamente.
Defendo, no entanto, que se enquadre o EBITDA na análise da cobertura do serviço da dívida, tanto mais que estruturalmente os resultados líquidos são negativos.
Agora penso que o Auditor tem uma certa razão quanto à perspectiva adequada para a análise da situação financeira do clube. Não concordo com a não inclusão das vendas de jogadores nas receitas operacionais, tanto mais que esse é, assumidamente, o modelo de negócio do Benfica, mas de resto acredito, sempre, que a análise estrutural deve passar essencialmente pelo Cash Flow e não pelos resultados contabilísticos.
Evidentemente não podemos confundir EBITDA com Cash Flow, mas aceito-o como ponto de partida para lá chegar, ou seja, como Cash Flow Operacional - os recursos financeiros do clube no período. É com este valor que se poderão pagar os jogadores contratados, ou seja o Capex, mediante os calendários que são contratualizados com os clubes vendedores, suscitando o aparecimento de alguma ambiguidade entre Capex e Working Capital, ainda agudizada pelo facto de a SAD considerar, para efeitos de Cash Flow, os vencimentos do atleta contratado no bolo total da sua aquisição. Isto parece-me adequado (muito), mas faz com que a análise exterior ao clube não consiga uma boa aproximação do Cash Flow real.
Não tendo acesso aos prazos de pagamento/recebimento e agora também aos valores de aquisição (directamente), o EBITDA ganha relevo na análise como o agregado mais imediato que podemos observar. Agora é evidente que tem que se saber do que se está a falar.
Naturalmente o EBITDA não te dá a liquidez residual e nem sequer a gerada, uma vez que não considera o prazo de recebimento nas alienações, agora também não sei quem é que a procura encontrar por aí. No entanto, da minha perspectiva, para analisar a performance da gestão do clube tem muito mais interesse olhar para a evolução do EBITDA do que para os resultados líquidos. Isto não quer dizer que a análise fique pelo EBITDA, quer dizer que é um indicador da gestão, com relevo.
Haverá que considerar outros aspectos, como a dívida e o serviço da dívida que se admite, ou os resultados desportivos que se conseguem e os ordenados que se pagam. No entanto, pelo menos para o Benfica que eu desejo, é essencial que haja capacidade para desenvolver o EBITDA, de preferência sem uma ênfase excessiva do lado dos gastos - sim o que eu pretendo é criatividade e competência na diversificação e aumento das receitas e um controle de gastos apenas adequado, que não passe, por exemplo, pela saída do Aimar...
Cumprimentos
@Auditor,
Referes que a venda de jogadores é uma actividade "que não faz parte da actividade operacional do clube e, logo, do EBITDA".
Se verificarmos em 2012, temos:
Proveitos Operacionais - 91 milhões
FST - 24 milhões
Pessoal - 48 milhões
OCO - 2 milhões
ou seja o EBITDA deveria rondar os 17 milhões, mas se olharmos aos valores divulgados pela Benfica SAD o EBITDA foi de 46 milhões, a diferença entre estes 2 valores é de 29 milhões, ou seja, o valor de proveitos com transacções de atletas.
Por muito que não o consideres, o Benfica e qualquer outro clube, inclui a os proveitos de alienações líquidos dos custos como uma componente do EBITDA.
@Bicadas
Quando comparas os Passivos de curto prazo - 259 milhões, com os activos de curto prazo - 78 milhões como podemos falar de outra coisa que não de enormes necessidades de investimento em working capital ?
Podes argumentar que nos activos não se encontra o plantel e como tal o investimento não será assim tão enorme, visto o Benfica ter mostrado capacidade para transformar activos não correntes em activos correntes.
No entanto se reparares o fluxo das actividades operacionais é de 7,5 milhões em termos consolidados e de 3,9 em termos individuais, ou seja, a actividade verdadeiramente operacional não liberta fundos tão grandes como se poderia esperar.
Ao contrário de ti, eu não considero que as vendas devam ser consideradas como actividades operacionais, mas antes num modelo equilibrado, as vendas libertar os recursos que permitem adquirir novos jogadores, sendo que deverá ser a receita operacional a suportar quer a despesa operacional, quer mesmo as despesas financeiras.
A questão, é que é necessário amortizar a dívida, pois este montante não é sustentável, tanto mais que a maioria dos passivos bancários são a curto prazo e quiçá nem todos serão passíveis de operações de revolving.
Assim sendo, no meu entender, deverá ser a actividade operacional a sustentar quer os encargos financeiros, quer parte da amortização do passivo bancário, sendo que o remanescente deverá vir das actividades de financiamento, ao invés dos quase 29 milhões negativos que foi o valor do fluxo destas actividades na época transacta.
Nos posts seguintes abordarei a questão das receitas e os riscos associados à falta de desempenho desportivo nas competições europeias na geração das receitas
@Bicadas,
2011-12:
Net Operating Cash-Flow 7,5 milhões
Capex 47,4 milhões
Free Cash-Flow - 39,9 milhões
2010-11:
NOCF 3,6
Capex 52,3
FCF -48,7
2009-10:
NOCF -10,5
Capex 37
FCF -47,5
2008-09:
NOCF -15,2
Capex 41,6
FCF -56,8
2007-08:
NOCF -2,1
Capex 34
FCF -36,1
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