quarta-feira, 23 de junho de 2010

O jogo impossível

Quando somos crianças, há em nós imaginação e bizarria suficientes para sempre buscarmos o mais improvável dos acontecimentos, mesmo que seja só na nossa cabeça. Uma das coisas que eu gostava de pensar era em jogos intermináveis. Mal acabava um prolongamento, perguntava ao meu Pai: "isto pode não acabar, não é?" e deliciava-me a ideia de duas equipas ficarem a marcar penalties durante um mês.
No ténis, também é possível querermos que dois bípedes morram em campo estoirados de jogar. Basta que cheguem ao 5º set empatados. Depois é esperar que se mantenham equilibrados até ao fim e esperar que a partir do 6-6 eles nunca mais abandonem o campo pelo menos durante uma semana. Sempre que o jogo chega a este ponto, sobe-me um desejo cruel de ver mais horas e horas de dois jogadores arrasados, caindo, tropeçando nos jogos, um atrás do outro, fazendo subir o placard para números impossíveis. Mas nunca me fazem a vontade. Ora, hoje fizeram. Cumpri um sonho de criança. Nicolas Mahut e John Isner fizeram o jogo dos jogos, a História do Ténis mudou. Se não viram, tenho pena, eu vi, invejem-me se quiserem.
Nada mais nada menos do que isto:
Mahut - 4 6 7 6
Isner - 6 3 6 7
O 5º set, é isso que querem saber, não é?
Pois deliciem-se:
59-59!!!!*
Brutal.
A partir dos 25-25, acreditem, os gajos começaram a querer que aquilo acabasse. Via-se nas caras deles a vontade, a suprema vontade, de que aquilo acabasse de vez. O cansaço, físico mas principalmente mental, era tanto que eles já não esboçavam reacção, parecia que estavam em piloto automático, jogo atrás de jogo, hora atrás de hora. Por outro lado, o desejo animal de não querer de maneira nenhuma perder aquele jogo. Eles sabiam que o que passar não vai ter capacidade de recuperação para a próxima eliminatória mas ali já não era ganhar o Wimbledon que estava em causa, era mais importante do que isso: ganhar o jogo mais longo de sempre da História do Ténis!
O campo, que é um dos MUITO secundaríssimos, começou a encher, a encher, gente de todo o lado, amontoada uma sobre a outra, chegava ao court nº18. Quando o árbitro, acabado um jogo, dizia 42-42 as pessoas riam-se, os comentadores em euforia por estarem a comentar um momento único na História do Desporto, eu (e imagino todos os que estavam a ver pela net, televisão, ao vivo) em suspenso, a querer mais, muito mais. Eu não tenho a certeza se eles ainda lá não estão.
Obrigado, Mahut. Obrigado, Isner. Obrigado, Ténis. A criança em mim ri desvairadamente de todos os adultos deste mundo.
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* O jogo continua amanhã. Vai em 10 horas. Já se fizeram 192 ases (Isner 98; Mahut 94) e 651 winners (Isner 333; Mahut 318).

4 comentários:

Ricardo disse...

Acabou.70-68 para o Isner.


Agora batam isto, senhores!

mago disse...

Eu também adoro confrontos intermináveis, aliás acho que é por causa disso que gosto de desempates por penalties (expecto quando é com o Benfica...) e que fico pior que f*dido quando estou a ver um prolongamento qualquer e me roubam essa possibilidade com um golo durante o mesmo.

Nunca vou esquecer este jogo (e logo em Wimbledon!), pelo menos enquanto a saúde mental mo permitir. Podiam era não ter submetido o Mahut a todo aquele circo no final, mas... Pronto.

"Obrigado, Mahut. Obrigado, Isner. Obrigado, Ténis. A criança em mim ri desvairadamente de todos os adultos deste mundo."

Mai'nada. Exemplarmente dito.
Cheers!

Ricardo disse...

Grande mago!

Completamente. Pensei o mesmo. Claro que se percebe que eles quisessem tirar umas fotos com os jogadores ao lado do placard (tinha mesmo de ser) mas, eh pá, acho que exageraram um bocado.

Mas, lá está, este não foi um jogo normal.

Abraço!

Lampião do Norte disse...

O "Lampião do Norte" está de volta!
Visitem!