terça-feira, 10 de setembro de 2019

Com os jogadores do City...


A chegada de Pep Guardiola ao comando técnico da equipa principal do Barcelona, trouxe consigo um impacto que, quanto a mim, ainda está por calcular em toda a sua total extensão. Pela primeira vez em longos anos, uma equipa exclusivamente baseada no talento conseguiu disputar e vencer as maiores provas do mundo do futebol, contrariando de uma só vez, uma infinidade de leis não escritas que de tanto ditas e repetidas se haviam tornado verdades absolutas no futebol mundial.

Tais conceitos versavam sobre a impossibilidade de se vencer encantando adeptos e rivais; dizia-se ainda que o futebol “moderno” era intolerante e incompatível com equipas baseadas essencialmente no ataque; jogar no corredor central? Jamais compensaria o risco; jogar no corredor central e com baixotes? “Líricos” diziam eles; e tantos outros dogmas que foram destruídos por um só homem e uma só ideologia.

O sucesso desse Barcelona dos “baixotes” foi de tal ordem que ninguém ousou dizer que não gostava do estilo. Sim, porque só as vitórias convencem a larga maioria de adeptos e protagonistas do jogo, nunca a ideologia que subjaz a cada estilo. Ganha? É bom. Perde? É fraco, mesmo que no dia seguinte o que é fraco passe a bom, porque ganhou, ou o inverso porque perdeu. Mas para além das vitórias, há algo mais nesse jogo que faz com que ninguém ouse dizer que não gosta: a inteligência. De facto, se há predicado absolutamente necessário para se jogar e compreender e jogar o estilo de Pep Guardiola são mesmo as faculdades cognitivas aliadas às faculdades técnicas. E quem é capaz de admitir facilmente que não gosta ou não compreende a inteligência de outro? Antes, procuram desqualifica-lo, mas enquanto isso não sucede por via dos resultados (o que mais?), não há como desqualificar o que é altamente qualificado.

E é por medo e vergonha que as vozes dissonantes do técnico Catalão se vão mitigando e, no limite, se vão procurando colar à sua ideologia, embora não cheguem sequer perto. E é nessa sequência, nesse processo mental que surgem sempre os comentários que procuram desmerecer o extraordinário pensamento e metodologia e Pep Guardiola, traduzidos na frase: “Com os jogadores do Barcelona/Bayern/City também eu jogava assim”. A infinidade de gente que já disse isto, desde adeptos a treinadores, passando por comentadores, deixa-me na dúvida se o dizem por mera dor de cotovelo ou, por outro lado, se por acharem mesmo que a ideologia nasce dos jogadores, bastando para tal junta-los e esperar que tudo aconteça por geração espontânea.

Pois bem, nem o jogo de Pep nasce dos jogadores, nem quem acha e afirma a frase transcrita acima escolheria os jogadores que Guardiola escolhe. E este último facto é mesmo mais extraordinário de todos. É que se me parece relativamente normal que nem todos consigam replicar aquele estilo de jogo - caso fosse fácil, de facto, não faria de Guardiola um treinador tão extraordinário - já me parece completamente surreal que afirmem ser dos jogadores que nasce todo o mérito, mas na hora de escolher os seus, escolhem tudo menos os que mais próximo estariam daquele perfil.

“Esses jogadores são caros” – diriam uns quantos. Mas não são todos? Quantos autênticos cepos são transacionados a preço de craque? Mas ignoremos este argumento e aceitemo-lo como verdadeiro e analisemos aqueles que não têm no preço dos jogadores qualquer restrição na hora da escolha: os selecionadores, mais concretamente, Fernando Santos.

É um facto que Fernando Santos não tem no preço dos jogadores um inibidor na hora de escolher, sendo então de supor que nada se colocaria entre ele e as escolhas de jogadores de perfil “Barcelona/Bayern/City”, seja para as sucessivas convocatórias, seja nas escolhas para o 11. Pois bem, mesmo sem esta inibição, o engenheiro faz gala em achar que, por exemplo, hoje em dia existem 11 Portugueses melhores que João Félix. “Não é bem assim, apenas acha que Félix não pode jogar com Cristiano Ronaldo e Bernardo Silva em simultâneo”, dirão. E o resultado não é o mesmo? O que Fernando Santos acha mesmo, é que a Seleção é tanto melhor quanto mais talento estiver fora dela, porque é simplesmente inadmissível que em 11 jogadores, ignore um dos 3 melhores da atualidade. Fernando Santos não sabe nem saberá nunca como conjugar os melhores, preferindo sempre uma ideia de jogo profundamente medíocre e miserabilista, tenha ele quem tiver ao dispor.

E o nome aqui nem é assim tão importante, porque o Fernando Santos desta triste história, poderia ser um José Mota, um Tiago Fernandes, um Lito Vidigal, um Jorge Simão ou qualquer um dos 99% de treinadores categorizados cá do sitio, porque todos eles iriam afirmar sem qualquer problema que “com os jogadores do Baça/Bayern/City também eu”, mas no momento de os ter ao dispor… só por obrigação estatutária é que os escolheriam.

E este é Portugal: Ter qualidade individual para um futebol de qualidade, mas que vive agarrado e amordaçado por um conjunto de treinadores que se caricaturam todos num individuo que venceu um Europeu com o mérito de um tipo que sobrevive a um tsunami agarrado a um pedaço de madeira.

Por isso, sempre que se ouvir a frase “com os jogadores do City também eu”, que não se tenha medo de dizer: é MENTIRA! É mentira, porque o nome dos jogadores não influi no pensamento de cada um; é mentira, porque quem o diz não faz ideia do que é qualidade; e é mentira, porque sempre que a tiverem ao dispor, vão varre-la rapidamente para baixo de um qualquer tapete!

Não tenho grandes dúvidas de que hoje em dia, Fernando Santos é um dos que mais torce para que João Félix não faça assim tanto ao serviço do Atlético, porque se o “puto” explodir em Espanha, o engenheiro não terá como varre-lo para o banco de suplentes, porque não saberá nunca como, realmente, tirar partido dos verdadeiramente melhores.