terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Benfica e Porto no Bessa

Aquando da sua eleição para a presidência dos Boavisteiros, Vítor Murta exultou sobre a necessidade da equipa de futebol do clube voltar a ser o “Boavistão” de fim do século passado/inicio do presente, corporizado no epíteto, e cito, “em que era canela até ao pescoço”.


Obviamente que isto não é para ser levado à letra (ou pelo menos, imagino que não seja) e tal frase procura, isso sim, traduzir uma forma de jogar essencialmente focada nos fatores emocionais e físicos do jogo. E, goste-se ou não, Vítor Murta foi sagaz ao perceber que Lito Vidigal seria um dos melhores protagonistas ao dispor para escavar um buraco no tempo e fazer a equipa recuar aos anos 90. Enfim, Vítor Murta quis, Lito Vidigal sonhou, a obra nasceu. 


Porém, mais do que falar sobre o Boavista em si, importa-me mais identificar na sua equipa um estilo de jogo e confronta-lo consigo mesmo ou com algo bastante diferente e, para tal, recorrerei a dois jogos em que o Boavisteiros, fossem quais fossem as circunstâncias, tenderiam sempre a perde-los. Falo, como será fácil de perceber pelo título, dos jogos frente a SL Benfica e FC Porto.

No derby da cidade do Porto assistimos, penosamente, a um jogo assente em constantes duelos aéreos e físicos, entre duas equipas de almas gémeas e onde a lei do mais forte acabou por imperar. Sem prejuízo do resultado, foram bastante visíveis as dificuldades que o FC Porto teve para levar os 3 pontos em disputa, parecendo até, em vários momentos, que as qualidades individuais dos jogadores ao dispor de ambos os conjuntos se apresentavam indistintas e/ou bastante marginais, coisa que, sabemos, não é verdade. Displicência azul e branca? Não me parece, de todo. Transcendência axadrezada? Talvez. Mas o que realmente concorreu para esse nivelar de qualidades foi o facto de a equipa mais forte - FC Porto - aceitar levar o jogo para um patamar onde as diferênças se diluem e as qualidades que verdadareiramente importam não aparecem, porque grandes, rápidos e/ou agressivos podem ser todos, mas relacionar-se bem com a bola e com os companheiros... não é para quem quer, apenas para quem pode!

Por oposição a isto, temos o jogo que o Benfica foi fazer a casa dos Boavisteiros. Ao contrário de Sérgio Conceição, Bruno Lage foi à procura de um jogo que eliminasse ao máximo toda a físicalidade que o Boavista quisesse impor, fazendo-o com um jogo de passe curto, associativo e de paciência, sem momentos de acelerações a cada passe, sem jogo directo a potênciar duelos aereos, ou seja, sem nada do que poderia fazer aproximar a qualidade superior dos seus jogadores à qualidade (ou falta dela) dos jogadores adversários, retirando do jogo todos os factores em que o Boavista poderia ser igual ou até superior ao Benfica. Resultado? Um jogo bastante tranquilo e uma das melhores exibições da época. Não foi um jogo perfeito, mas foi bastante melhor do que o Porto havia feito no mesmo estádio e do que a própria equipa do Benfica vinha fazendo até aí.

Este duplo exemplo colocado em oposição entre si, procura apenas demonstrar de forma bastante básica e simples que a resposta a qualquer dificuldade será sempre a da inteligência e qualidade de execução, sempre! Mesmo contra equipas cujo poderio físico é importante, se em vez de o contornar o procurarmos confrontar, por certo vamos ter bastantes dificuldades e imprevisibilidade no jogo. E exemplos destes ocorrem todos os fins-de-semana, tão faceis de ver e entender que me causa sempre uma enorme preplexidade a forma como se continua a acreditar que o caminho a seguir é o caminho da imponência física e emocional, deixando a relação com a bola e com o jogo para segundo ou terceiro plano, tal qual Sérgio Conceição afirmou recentemente. A ser como o timoneiro Portista afirmou, seria muito mais complicado defrontar o Boavista do que o Barcelona... Absurdo, não?

P.S. 1 - Para Bruno Lage: A tenacidade defensiva de Seferovic e Cervi é bastante útil ao colectivo? Sim e é bom que assim seja, porque com eles em campo, seja por erros técnicos ou de decisão, a equipa passa muito mais tempo sem bola do que passaria com qualquer outro dos seus colegas a jogarem nas suas posições.

P.S. 2 - Para Sérgio Conceição: Na mais recente visita do FC Porto ao Jamor, a equipa melhorou claramente com a entrada dos portentos físicos Sérgio Oliveira e Nakajima, em substituição dos virtuosos Loum e Manafá, não foi? Ontem mesmo, no jogo com o Tondela, o FC Porto fez o melhor jogo em organização ofensiva da era Sérgio Conceição, porque conseguiu juntar no mesmo 11 a potência física de Nakajima, Luis Diaz, Corona e Otávio, certo?