Dia 25 de Janeiro de 2004, domingo cinzento e chuvoso.
Era dia de jogo do Benfica. Para (não) variar, o meu pai não me havia deixado
sair para o café e ver o Benfica – já me tinha resignado à condição de ouvir os
sucessivos relatos e ver através da voz de quem os fazia.
Com o aproximar da hora do jogo o temporal ia-se
adensando e com isso o sinal rádio ia-se perdendo.
O jogo começava e, tal como a equipa, o relato da
antena 1 ia chegando aos soluços.
O jornalista (não me lembro qual) ia referindo algumas
quezílias e muito mau futebol. Não sei, nunca fui capaz de rever aquele jogo
fosse pelo meio que fosse.
Ao intervalo o nulo, diziam os jornalistas,
ajustava-se ao que se havia passado em campo e havia a espectativa que Camacho
e Jorge Jesus conseguissem alterar aquele estado de coisas, mas também pairava
o temor pela deterioração da qualidade de jogo com o avançar do tempo, por via
do mau estado do terreno.
Já com a segunda parte em decurso (talvez a meio? Não sei,
não consigo recordar), Camacho decide trocar João Pereira (que actuava como
extremo direito naquele jogo) por Miklos Fehér e assim juntar o húngaro a
Sokota na frente, apoiados de forma mais directa por Zahovic e Simão.
Diziam as vozes que eram os meus olhos, que Camacho
tentava alargar a frente de ataque e explorar um jogo mais directo, evitando
assim um relvado que se tornava mais pesado a cada minuto.
Não sou hipócrita, Fehér nunca foi um ídolo para mim,
nunca vi no húngaro classe suficiente para jogar no melhor Benfica, mas quem
daquela equipa tinha essa classe? Talvez Simão? Talvez Zahovic nos melhores
tempos, que nem foram no Benfica? Por isso, não foi com especial entusiasmo que
ouvi a alteração promovida pelo espanhol. Escutei-a e recebi-a com a eterna
esperança que dali resultasse a saída para mais uma vitória.
Mas as coisas não ficavam melhores, lembro-me que,
volvidos alguns minutos, o Vitória tem uma oportunidade soberana de golo, salva
em cima da linha por alguém do Benfica.
Mais alguns minutos e entra em campo Fernando Aguiar
para o lugar de Zahovic. “Mas que caralho! Estamos empatados e tiramos um 10
para meter um trinco?” Pensei eu. Mas tal como havia acontecido com a
substituição anterior, a esperança que ali estivesse a solução para aquele
problema não se diluía.
Os minutos corriam e as unhas desapareciam. A
transmissão estava agora mais estável e melhor de seguir. As faltas e o mau
jogo permaneciam, diziam eles.
Minuto 90, Simão ganha a linha e cruza atrasado,
confusão na grande-área e GOLO! Fernando Aguiar, o destruidor de jogo e homem
de combate que havia entrado para o lugar do organizador Zahovic empurrava a redondinha
para o fundo das redes do Vitória.
“Agora é só aguentar” dizia eu para mim.
Mais alguns segundos e Fehér atrasa um lançamento de
linha lateral, é admoestado com cartão amarelo e enquanto sorri… Cai! Não dei
grande relevo à situação por estarmos nos minutos finais e prestes a obter uma
vitória arrancada a ferros, admito, pensei “mais alguns segundos e está feito”.
O quanto me dói e me repulsa a minha figura por este pensamento me ter
atravessado a mente.
Ali, a escassos segundos do final do encontro, em dia
de aniversário do Rei, em ano de centenário do Glorioso, Miklos Fehér, um jovem
que tantos ritmos cardíacos e de tantas cores acelerou com os seus golos,
tombava traído pelo seu próprio coração.
Desculpa Fehér. Desculpa a mente e coração de um jovem
incauto que não entendeu o momento e que num espasmo de sobranceria te ouviu
partir sem compreender a injustiça da vida. Ajustaremos contas no 4º anel.
3 comentários:
Desse dia só guardo o seu sorriso de bom MENINO e o impacto brutal da sua nuca no relvado.
Boa tarde José. Caso o facto de nunca teres visto o se prenda com os meios técnicos e não com a carga sentimental, fica o link para que o possas visualizar na íntegra: http://www.youtube.com/watch?v=X4ZCrX81tyE
Um abraço.
Obrigado Anónimo das 14:49, mas não vi mesmo por questões sentimentais. Nnunca suportei a ideia de ver um jogo que sei ter acabado na tragédia que todos conhecemos. Mas, mais uma vez, obrigado ;)
Forte abraço.
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