sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Dá-me uma desmemória

Não consigo livrar o meu corpo do Benfica. Carrego-o para os confins do mundo, vou no ar para o Brasil, volteio no Matogrosso, esqueço-me de mim na estrada da morte que chega a La Paz ou então enterro os dedos na terra perto de uma fonte de água ali tão perto de um sítio que é perto e quase longe de Abrantes. Mergulho por cima de uma pedra e a cabeça vai em voo rasante ao Benfica até à água e depois até ao fundo do poço onde descubro colares cheios de lima e de tempo. Pego neles como tesouros e as limas que vão soltando a nhanha milenar dizem coisas estranhas, como se estivéssemos todos jacarés.

Hei-de afastar-me do Benfica num sítio qualquer. Falta-me a Ásia e sua cavalgadura de cheiros e aromas, nomes sem aviso e questões. Perguntarei a alguém com boa cara: "é aqui a Ásia?" e alguém responderá com solavancos-soluços, no seu idioma de guitarra eléctrica: "é, sim senhor, é sempre em frente". Comerei vertigens de molhos e lugares desconhecidos, ventos diferentes e luas, rios cheios de estranheza. Hei-de procurar Portugal naquilo tudo e sentirei vergonha e também orgulho, não sei bem porquê nem como, achando que vivo para além do Benfica. 

E depois isto: esta lama em que rodopio em transe por tudo, estas luzes sobre o Tejo, milhares (milhões?) de ligações que se entretelam nos poros e nos assustam e provam que somos muito menos distanciados da origem do que supomos. Não, eu quero afastar-me do Benfica, ir descobrir conventos e túmulos, passagens subterrâneas para o esquecimento clubístico. Basta isto: apanhar o avião para o próximo Bosão de Higgs.

5 comentários:

BENFICAHEXACAMPEÃO disse...

Gosto de pensar o Benfica também dessa maneira... simbiose de emoções humanas, cruas - carne viva!

João Duarte disse...

Qdo parares ficas 20 anos sem ir ao estádio. A sofrer em silêncio.

Um dia o teu filho diz q é do Benfica e tu confessas q és simpatizante.

Andas a dar demasiada importância a isto.

Eu só dou importância qdo subo para o alto dos moinhos. Tenho medo da overdose de Benfica.

Constantino disse...

O Benfica é como o casal ventoso: uma pessoa pode sair do Benfica... mas o Benfica nunca sai dessa pessoa. Sei que é uma doença e o que vou dizer pode parecer politicamente incorrecto, mas... fico feliz por saber que não sou o único a padecer do mal. Não sei como fazes, mas normalmente quando tenho violentos ataques de Benfiquite em dias sem jogo, normalmente resolvo a coisa com 2 colheres de golos em Liverpool ou 6 gotas de bailinho de alvalade, isto claro, depois de limpar a espuma dos cantos da boca.

Abraço

Anónimo disse...

fumas umas coisas potentes!

jose garcia disse...

Ainda que seja uma coisa maravilhosa, descurti bué esta posta.
Porque por mais que eu descurta o teu tom, a esmagadora maioria das vezes dizes exatamente aquilo que eu penso.
Porque por cada verdade que dizes aqui, eu sinto-me like a virgin, touched for the very first time (e a não gostar...). Ou seja, sou daqueles que não tem problemas em varrer para baixo da cama.
Por isso te odeio, e por isso te venero.
Uma coisa é certa: tu já és uma instituição e já perdeste o direito de escolha - tu já és o Benfica também.
Vais ter que partilhar isso connosco o resto da vida.

Perdoa-me a parvoice, a fezada, mas há noites que correm muita bem :)

Grande abraço ribatexano