Diz
o Ricardo que é um problema o Benfica estar cheio de benfiquistas.
Permitam-me ir um pouco mais além: é um problema o Benfica estar cheio
de
benfiquistas portugueses. É que é muito portuguesa esta coisa de
se fazer ruído por tudo e por nada - portuguesíssima a de fazer ruído
por nada, focando o acessório em detrimento daquilo que é verdadeiramente essencial. O
que é que se discute mesmo? Não interessa. Argumentos? Coisa de somenos.
O que importa é esbracejar,
vociferar e pontapear o ar violentamente (mas só o ar, que isto é tudo
gente pacífica
e ninguém se quer aleijar) como forma de mostrar desagrado. E, já se
sabe,
quem no final fizer o ar mais indignado de todos leva a taça de melhor
benfiquista. Ou, pelo menos, leva essa convicção para a almofada - o
que, convenhamos, já não é mau.
Nesta
modalidade olímpica que é a maratona de autismo conjecturam-se todos os
cenários possíveis
e imaginários para não enfrentarmos aquilo que está diante dos nossos
olhos. E tal como
num bom livro encontrado na secção “Crime” da mini-biblioteca lá de
casa, o que está
diante dos olhos nunca é verdade porque é demasiado óbvio. Também a
proliferação da TV por cabo nos lares portugueses na última década tem
culpas no cartório: a quantidade absurda de ficção que nos despejam
diariamente na sala de estar deixa-nos um bocado
alucinados e com a mania de que somos o Gil Grissom lá do bairro. Há que procurar ver sempre mais além, mesmo quando além não há nada para ver.
Vem isto a
propósito de andar tudo histérico com as declarações de dois adeptos do Benfica
- e aqui permitam-me o desvario de colocar a hipótese de que dois rapazolas
vestidos à Benfica à saída de um jogo do Benfica possam ser mesmo adeptos do Benfica – à porta
do Estádio Cidade de Coimbra donde, sem grande brilho mas ainda assim
meritoriamente, trouxemos mais um caneco para o Museu da Luz. Nem vou deter-me
sobre o teor das declarações dos jovens, até porque a corrente de pensamento que brotou das
mesmas é muito mais interessante e divertida. Deliciosa para quem não se nega a
uma boa dose de intriga.
Esta inatacável
doutrina - que já fez escola por essa
blogosfera fora - baseia-se no sólido pressuposto de que os moços
aparentemente
chateados com o insucesso desportivo do Benfica nos últimos anos não são benfiquistas. Mais: é óbvio até para a alma benfiquista mais desatenta -
mas ainda assim dotada de uma sagacidade acima da média - que aquilo
são andrades
cujo único propósito é o de tentar minar a estabilidade do nosso clube.
Ora isto faz todo o sentido,
na medida em que o
Benfica está de tal forma ameaçador que desperta nos adversários uma
necessidade premente de inventar novas e insuspeitas formas de travá-lo.
As arbitragens habilidosas com que nos brindam semanalmente,
os sucessivos espectáculos de Harakiri de Luís Filipe Vieira e a
incompetência –
ou teimosia, ou as duas, nunca saberei muito bem - que o nosso treinador
tem demonstrado ao longo das últimas duas épocas já não chegam para
descansar os nossos rivais.
Como
parar então esta máquina infernal que é o Benfica actual? Simples:
envie-se um par de adeptos infiltrados para a porta dos estádios onde
joga o Benfica, vestidos à Benfica, com uma sandes de courato à Benfica
numa mão e uma mini à Benfica na outra, fingindo estar muito indignados
com a ausência de títulos europeus e nacionais
que um dia lhes foram prometidos por dirigentes e treinadores. Devem,
também, esforçar-se por demonstrar enorme desilusão por um
campeonato quase ganho pelo seu clube e que há muito deveria estar
ganho pelo clube de que fingem ser. Todo o procedimento atrás descrito
deve ser repetido até aparecer um canal de televisão que registe o
momento. Muito espertos e imaginativos, estes andrades.
Há que admiti-lo, meus
amigos: isto é uma ideia genial! Isto, sim, é desestabilizar os adversários com muita
classe. É muito provável que estejamos perante aquela que é apenas a
maior invenção do Homem desde os crepes congelados da marca Continente.
Qual fruta qual carapuça. Futuramente, a chave do sucesso desportivo de
um clube estará na
sua capacidade para enviar adeptos disfarçados de outros adeptos para as
portas
dos estádios adversários. Este plano maquiavélico vindo do norte até
podia ter surtido efeito em Coimbra, não fosse o facto de desconsiderar a superior
astúcia do adepto benfiquista. Já vos topámos, ó andradagem! Preparem-se para o pior, pois acabam de comprar uma guerra que jamais poderão vencer. No dia
em que tiverem 6 milhões de marmanjos à porta do dragão envergando cachecóis
com a inscrição “Morte aos Lampiões” tenham noção de que é o princípio do vosso fim.