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sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O que ainda falta ao Benfica - 5 diferenças entre a frustração e a glória

1) Dois laterais de qualidade superior (e um central) - Penso que é hoje óbvio para todos que Emerson não serve como primeira opção - nem sequer, opinião pessoal, como alternativa. Uma falha grave no planeamento da época que pode ter repercussões dramáticas, se não se encontrarem formas de admitir o erro e o colmatar com um jogador de qualidade acima de qualquer suspeita. A meu ver, é muito simples: se Emerson for o titular até final de época, todos os objectivos da equipa estão seriamente em risco. Esperemos que, por parte de quem pensa o futebol no Benfica - dirigentes e equipa técnica -, haja a humildade suficiente para deixar cair a primeira aposta do Verão e a sabedoria necessária para encontrar uma solução indiscutível. 
Do lado direito, o cenário é menos grave, embora exista também um problema: falta um jogador que não só seja alternativa a Maxi como lute com o uruguaio pela titularidade. O lateral-direito tem qualidades que todos apreciamos - intensidade, agressividade, dinâmica ofensiva, garra, querer "à Benfica" - mas está longe de constituir a melhor solução, ainda para mais numa fase em que parece estar a voltar aos primeiros tempos no clube. Os erros sucedem-se, como na época em que chegou: perdas de bola inadmissíveis, desposicionamento constante da linha defensiva (são vários os lances em que deixa o adversário em jogo), incapacidade para acompanhar o atacante do seu lado, quando a bola é cruzada da ala oposta, distracções, forma física deficiente. Maxi Pereira, por tudo o que tem feito nos últimos anos, merece ser uma aposta firme nesta equipa mas só teria a ganhar (e, por consequência, a equipa, que é o que mais importa) se tivesse competição séria dentro do plantel. 
Menos premente do que nas laterais - mas que obriga a uma reflexão -, surge a questão do central que seja alternativa à dupla titular. Jardel não é suficientemente bom para o Benfica e Miguel Vítor poderá ser pouco, no caso de uma lesão prolongada de Luisão ou Garay. De contactos anteriores com o Vasco (clube no qual temos dois jogadores emprestados, o que serve como arma favorável à negociação) e pela qualidade indiscutível que tem, Dedé seria uma tremenda mais-valia em Janeiro.
Todas estas questões foram aqui identificadas em Agosto. E, se não têm sido motivo de preocupação maior, à regularidade dos titulares e à capacidade colectiva da equipa muito devemos. Mas isso não invalida que tenha havido uma deficiente abordagem à planificação do plantel. Que os erros sejam admitidos e superados, é o que se espera de uma Direcção que diz querer uma época desportiva de glória. Caso contrário, a frustração - à imagem da época passada - será um cenário facilmente adivinhável.

 
2) Preparação mental/orientação disciplinar - A expulsão de Cardozo no último fim-de-semana deverá servir como estudo sobre a falta de uma orientação clara por parte de quem gere o futebol no clube. É evidente a injustiça da decisão do árbitro, tal como evidentes têm sido várias injustiças arbitrais ao longo da época. Sobre esta premissa - que se alastrará e provavelmente se intensificará nos próximos meses -, deverá assentar a pedagogia feita aos jogadores. Se temos a noção de que, a qualquer acto mais "espontâneo" dos nossos atletas, surgirão medidas drásticas por parte de quem arbitra os nossos jogos, a única resposta - porque é a que podemos controlar - passa por condicionar os nossos a um comportamento exemplar dentro do relvado, fazendo-os compreender que da capacidade de disciplina e auto-controle dependerá o sucesso do colectivo. 
A expulsão do Cardozo não só prejudicou a estratégia num jogo importantíssimo - que felizmente superámos, mas que poderia ter criado consequências nefastas - como nos retirou uma solução, a mais efectiva, para o jogo na Madeira. Como este caso, outros houve em que os nossos jogadores foram admoestados, justa ou injustamente, sem razão para tal; apenas e só porque não souberam reagir mentalmente a uma decisão arbitral - Aimar, especialmente, torna-se repetitivo na recolha de amarelos idiotas. 
Compete a quem lida com os jogadores que estas situações aconteçam muito raramente e em momentos impossíveis de contrariar o sentimento de injustiça. Tudo o resto, deverá desaparecer. Também passa por aqui a diferença entre uma equipa adulta e um equipa incapaz de gerir emocionalmente os vários momentos de um jogo.


3) Qualidade nas bolas paradas ofensivas- Há um paradoxo na forma como a equipa aproveita as suas qualidades: se, por um lado, pelo tipo de jogo que apresenta, as situações de bola parada são em grande número e, pelas características dos próprios jogadores, há uma vantagem clara em relação a quase todas as outras formações ao nível da estatura física e dos movimentos, bem treinados, que o colectivo desenvolve neste tipo de situação específica de jogo, por outro, e isto é que causa perplexidade, são em dose industrial as vezes em que a bola é mal pontapeada. 
Seja em cantos, livres laterais, livres à entrada do meio-campo, a percentagem de lances em que a equipa deixa de aproveitar as qualidades que tem por deficiente arremesso é sinal de preocupação e deverá ser seriamente estudado e melhorado. Não se admite que jogadores da qualidade de Aimar, Gaitán, Bruno César, Amorim marquem cantos e livres quase como infantis, batendo ou muito por cima ou tão fraco que a bola cai imediatamente nos pés do primeiro defesa adversário. 
A juntar a isto, que é consequência do mau arremesso, surge o mau posicionamento dos que ficam mais atrás em campo e da lenta reacção à perda de bola, gerando vários contra-ataques perigosos que, em vários jogos, poderiam ter definido as partidas de modo comprometedor. Vemos Jesus gesticular bravamente do banco, nessas situações. Mas o problema, como é óbvio, é dele e é a ele que devem ser pedidas responsabilidades: tudo advém do treino. 
E, se o treinador do Benfica é capaz de treinar eficaz e por vezes brilhantemente a movimentação dos seus jogadores dentro da área adversária, terá de saber igualmente como colocar a equipa de modo a que, primeiro, as bolas cheguem ao destino e, segundo, caso não cheguem, como deverá reagir o colectivo aquando da perda. Erros destes - que temos visto ao longo dos jogos desta época -, contra equipas de maior qualidade, serão letais. Para o jogo e, a médio prazo, para os objectivos até final do ano. Mais uma vez, a mesma linha quase invisível entre frustração e glória. Os detalhes que decidem épocas.


4) Saída de bola - No final do último encontro com o Sporting, Jesus, na sua bazófia habitual, defendia que a equipa está preparada para lidar com uma pressão agressiva e alta por parte dos adversários. Não está. Ou melhor: está, só que não da forma que possibilite a melhor estratégia para o jogo que queremos implementar. 
A resposta que está programada a um pressing agressivo (como o que o Sporting usou em grande parte do jogo do passado fim-de-semana), passa por criar, em jogo directo, duas zonas preferenciais de destinatários: o avançado, geralmente Cardozo, e a direita do meio-campo, geralmente Witsel ou Gaitán. É uma solução que permite menos risco mas que "entope" o jogar do Benfica, porque na altura da recepção o jogador está rodeado de adversários e porque muitas vezes não tem apoios para manter a posse. 
Esta solução serviria os interesses de muitas equipas mas defendo que ao Benfica, pela qualidade que tem, este é um tipo de solução que não interessa e, pior, prejudica gravemente a ideia de jogo que Jesus quer para os seus jogadores. Mais interessante, embora mais arriscado e que requer outro tipo de treino e aperfeiçoamento, seria solucionar o problema passando a jogar, mesmo contra equipas muito pressionantes, em posse de bola corrida e sempre rente ao relvado, usando preferencialmente o passe vertical em detrimento do jogo directo ou do passe em largura (neste particular, tendo uma peça como Emerson, é suicídio procurar a lateral como fuga). 
Como fazer isto, sem arriscar em demasia? Não baixar tanto Javi - mantendo-o no seu espaço da linha do meio-campo, criando um apoio alternativo e fixando um jogador adversário - mas baixar, em simultâneo, Aimar e Witsel, cada um do seu lado. Assim, o central que tivesse a bola tinha quatro apoios directos (o guarda-redes, o lateral, o outro central e o médio do seu lado) e um apoio indirecto (o pivot defensivo, que serviria não só de apoio ao apoio, caso a equipa criasse progressão, como de "tampão" às investidas do adversário, se este quisesse subir mais no terreno). Nesta configuração, que obviamente requer uma dinâmica mais trabalhada e uma maior certeza de passe, o posicionamento dos extremos seria fundamental: não abertos nas linhas, mas interiores, à frente de Javi. 
Num desenho, teríamos um dado com o número 5: Aimar e Witsel em baixo, Javi ao centro e César (Nolito) e Gaitán em cima. Espaços curtos, vários apoios, prioridade para as as combinações e a equipa mais junta, sem pontapés para a frente pelo ar e com várias alternativas para progredir, com bola, até ao meio-campo adversário. 
Claro que para os jogos com o Feirense até o jogo directo serve. Mas o Benfica entrará nos próximos meses numa espiral de jogos fundamentais contra equipas de grande qualidade e organização, em que o pressing à nossa saída de bola será uma constante (mesmo as equipas pequenas já perceberam que devem forçar, mesmo que com menos jogadores, a nossa posse logo no início, como forma de condicionar a dinâmica do nosso jogo). Encontrar uma solução que aniquile essa pressão alta adversária, sem que por isso percamos a nossa identidade, é, pois, fundamental para o sucesso a médio e longo prazo. Para a glória e não para a frustração.

5) Ter um Gaitán ao nível do seu talento - Das coisas que me custa mais ver neste Benfica é o desperdício criminoso das características únicas do argentino. Há ano e meio que falo em colocá-lo numa posição de menor dimensão física e de maior aproveitamento das suas qualidades - a segundo avançado. Gostava que um dia o Jesus o fizesse mas deixei de ter esperanças: Jesus quer interpretá-lo como um jogador de ala, com movimentos interiores, buscando a sua capacidade de desequilíbrio e de passes de ruptura. 
Assim seja: Gaitán numa das alas. Mas então há que moldá-lo à posição onde joga. Se Gaitán neste Benfica será sempre um ala, convém que tenha adquiridos os fundamentos básicos para que o colectivo não sofra com as displicências frequentes do argentino. Chamo-lhe displicência, porque não é uma questão de não entender o jogo. Gaitán simplesmente não quer fazer mais. Isso fica evidente nos jogos da Champions ou contra os rivais nacionais, em que se vê um jogador completamente diferente: apoia o lateral, dando apoios (não só ajuda fisicamente, como sabe ocupar os espaços), recua em sintonia com o adversário, fecha ao meio, dobrando colegas que se desposicionaram momentaneamente. 
Se um jogador faz isto em certos jogos, e fá-lo bem, é porque entende o que deve fazer a cada momento de um jogo. Se o não faz sempre (ou quase sempre), a culpa é do treinador, que permite que, em determinados jogos (a grande maioria), Gaitán se arraste pelo relvado, apenas esperando que a equipa conquiste a bola para finalmente acordar e começar a jogar futebol. Começa aqui a conquista de um Gaitán diferente: obrigá-lo a uma consciência defensiva colectiva para lá dos jogos de maior visibilidade. Se isto for conseguido, não só o argentino aumenta os níveis de concentração e intensidade - melhorando o seu jogo - como, por arrasto, toda a equipa se desenvolve em campo de forma mais eficaz - porque aproveita a qualidade inegável do jogador e deixa de estar condicionada à ideia de que deve compensar os adormecimentos de Gaitán, emperrando a própria dinâmica. 
Lembrem-se das vossas peladinhas de Quinta à noite. Recordem-se de quando sabem que têm lá um gajo que só fica à mama. O que é que acontece? Para lá de o chamarem de tudo e de acabarem à porrada com ele, em campo há sempre aquela ideia que vos martirza o espírito, sempre que vêem o adversário a cavalgar contra vocês: foda-se, recuo mais ou vou mais à direita para compensar a ausência daquele filho da puta que está a fumar encostado ao outro poste? 
No meio desta dúvida, nem vão à direita, nem recuam, nem pressionam, o cérebro pára ali por um segundo e quando vocês voltam à realidade já andam a correr feitos tontos sem saberem para que lado devem ir. Numa equipa profissional, em dimensões diferentes, isto também funciona assim: a confiança/desconfiança que temos em relação aos colegas de equipa faz toda a diferença não só no sucesso/insucesso mas individualmente na forma como tomamos decisões. Limpar o espaço de dúvida, garantir que cada um dos onze que estão em campo se concentrem nas suas aptidões e responsabilidades (não propriamente funções, porque o futebol deve caminhar para um jogo em que não haja propriamente funções em campo, mas uma osmose entre dinâmicas individuais), promover a solidariedade entre cada dois, entre cada três, no limite, entre cada 11, será sempre a melhor resposta à necessidade colectiva e a ao bem-jogar. 
Ter um Gaitán ao nível do seu talento não só traz à equipa a extraordinária capacidade criativa e original do argentino - que gera incerteza no adversário e dúvida sobre as soluções que lhe aparecerão pela frente - como solta todos os outros jogadores para, também eles, potenciarem ao máximo as suas virtudes. E quem ganha é o Benfica.