Esta pequena novela à portuguesa começa em 2008, mais precisamente no dia 8
de Abril de 2008. A blogosfera benfiquista enlutava com mais um título ganho pelo Porto como quase sempre são os títulos ganhos pelo Porto: competência aliada ao favoritismo sistémico. Levantavam-se uns, outros choravam o azar, criticavam-se os árbitros, anunciavam-se novas medidas, despediam-se treinadores, escolhiam-se jogadores, enfim, o panorama normal e caótico do mundo dos blogues. Houve, no entanto, quem decidisse organizar detalhada e muito acertadamente toda uma resenha de acontecimentos sobre o futebol português para assim ficarmos todos a par das movimentações mais clandestinas que, por debaixo da realidade visível, iam acontecendo. E é aqui que chegamos ao nosso protagonista, de seu nome Luís Fialho.
Luís Fialho fez um trabalho notável - escreveu um tratado sobre as razões que levaram o Porto, de 88 a 2008, a um sucesso desportivo assinalável, não se coibindo, porém, de, entre elogios, expor de forma magistral toda a teia de ilegalidades, corrupções, obtusos compadrios, negócios obscuros, estranhas alianças, enfim, fez um raio-x perfeito do que foi (e é) o modus operandi do clube vergado a uma seita comandada pelo cacique e fanático Pinto da Costa.
Chamou-lhe, muito poeticamente, "Vinte anos de mentira de A a Z". E o povo agradeceu. Afinal, estavam ali enumerados todos os pecadilhos, pecados e pecadões que toda a gente via, de que toda a gente falava, de que toda a gente se queixava mas que ninguém tinha organizado de forma decente e burocrática. Fialho fê-lo, com a conduta e espírito de missão que compete aos resistentes, aos que querem que o Bem vença o Mal, que o derrote pela dignidade e pela honra, pelos princípios verdadeiramente morais. O povo, naturalmente, reagiu a preceito: elogiou o protagonista, falou sobre o caso, promoveu o assunto, que "sim, senhor, está muito bem dito!", que "já faltava uma enciclopédia da corrupção como esta", que "finalmente temos um escriba que, além de tácticas e notícias de jornais, faz serviço público", que "este sim, é o tal, o prometido, o Haile Selassie dos blogues do Benfica!".
Foram, até à data, 288 comentários numa compreensível torrente de indignação e reserva dos valores mais altos, de uma exposição dos males e dos podres que levaram Luís Fialho ao justo patamar dos eternos. Dia após dia, semana após semana, ano após ano continuou Fialho a brindar-nos com escritos decentes, dignos e lúcidos, por vezes aproximando-se da actual direcção, outras, por convicções profundas, afastando-se em nome daquilo que sempre defendeu: a análise justa, imparcial, inteligente, independente, autónoma. Fialho concordou, Fialho discordou, Fialho abanou a cabeça, levantou o queixo, pôs-se a pensar mas nunca cometeu o erro do facilitismo. E é isso que faz de Fialho um herói para todos nós.
Recuperemos, a propósito de um tema recorrente e muito actual - a Olivedesportos e os direitos televisivos -, o que escreveu Luís Fialho sobre os irmãos Oliveira nesse notável texto de que falámos atrás. Sobre a letra "O", que, na sua extraordinária prosa, vem a seguir ao "N" de "Norte" e antes do "Q" de "Quinhentinhos", Fialho discorre assim:
«O de OLIVEIRAS – Juntamente com o irmão António, Joaquim Oliveira foi
elemento determinante na consolidação do poder portista. Ainda hoje o
clube da Luz tem as suas transmissões televisivas extremamente
sub-avaliadas, face à popularidade e audiências de que desfruta. Faz-me
alguma confusão Joaquim Oliveira ser accionista de referência da SAD
benfiquista, e ninguém se preocupar muito com isso.
Já o irmão
António (o do caso Paula, dos carimbos falsificados no caso N’Dinga, e
das polémicas do Coreia-Japão), ex jogador e treinador do clube
portista, protagonizou em 1992 um episódio curioso e revelador. Treinava
o Gil Vicente e na primeira volta, nas Antas, fez entrar um tal de
Remko Boere a um minuto do fim com o resultado em branco. Esse jogador,
que quase nunca havia jogado na equipa, nesse minuto apenas fez um
penálti caricato e recebeu ordem de expulsão. O F.C.Porto venceu 1-0. Na
segunda volta, em Barcelos, com o F.C.Porto já campeão, o Gil venceu
por 2-1 e salvou-se da descida à segunda divisão. Tudo em família portanto…»
Penso que estamos todos de acordo. Não há nada no excerto com o qual discordemos, está tudo ali, certíssimo, clarividente, nítido. Por mais que pensemos em encontrar alguma ponta solta no discurso de Luís Fialho deparamo-nos outra e outra vez com o muro da impossibilidade argumentativa. Fialho escreve, bem, sobre os Oliveira e detectou-lhes as estranhas movimentações que exercem no futebol lusitano. Mais uma vez, temos de assumir: Luís Fialho consegue atingir notas altíssimas, impossíveis aos comuns mortais de algum dia sequer sonhar em chegar perto. Ajoelhemos os corpos sob a notável inspiração literária e analítica de Fialho e, como não?, aceitemos o nosso destino de meros observadores do divino.
Mas esta história não acaba aqui. É que, numa estranha e curiosa mudança de direcção, o nosso herói fez-se vilão. Não sabemos, não temos dados, desconhecemos, a razão pela qual Fialho terá ingerido cogumelos estragados. Há indícios de uma perturbante alucinação, os médicos estudam ainda o caso, os especialistas confrontam ideias - ocupam-se disso ainda hoje, e já estão nisto há demasiados dias -, mas ninguém sabe ao certo o que terá ocorrido na zona específica do cérebro. Houve, inclusivamente, uma velhota que informou o Governo de que tem ideia - não sabe ao certo, mas acha que - de ter visto Fialho apaixonar-se por um lindíssimo cogumelo vermelho às pintinhas brancas e de, num acto de luxúria porém de clara irreflexão, o ter abocanhado com a fome e gula de 3 milénios de humanidade. Como estará hoje Luís Fialho é uma incógnita que só daqui a estafados exames e anos e anos de pesquisa científica poderemos saber. No entanto, deixamos já aqui a nossa indignação sobre a forma como o assunto tem sido tratado pelos bloggers benfiquistas. Acusarem Fialho, o nosso prometido, o nosso líder espiritual, moral e até mesmo higiénico, de ter escrito esta nojeira:
«O que está em causa na animosidade dos benfiquistas para com a Olivedesportos não é pois uma questão económica (aí, trata-se, sem dúvida, de um parceiro negocial poderoso), mas antes a colagem (não sei se inteiramente justa) que fazem daquela empresa ao Sistema que vigorou no Futebol português durante décadas, e que tanto nos penalizou.
Não conheço os bastidores do Futebol ao ponto de ter uma opinião inteiramente fundamentada sobre o assunto. Mas do que me é dado a ver, não me parece que tenha sido a Olivedesportos, nem Joaquim Oliveira, a ordenar ou a instigar Olegário Benquerença (...) sempre me pareceu que o objectivo de Joaquim Oliveira no Futebol era tao somente o comum a qualquer homem de negócios: ganhar dinheiro. Como tal, vejo-o, até prova em contrário, da mesma forma que a qualquer outro interlocutor. Apresentando a melhor proposta, e ninguém me comprovando devidamente a sua ligação ao "Sistema", nada teria - enquanto sócio do Benfica - a opor ao negócio...»
a mim causa-me asco.