O povo português é estúpido. Visceral, boçal e geneticamente estúpido. É capaz de cometer actos contra os seus próprios desejos na desesperada tentativa de não sofrer uma desilusão, de não perder a razão, com medo de que os outros (esquecendo-se que os outros não existem, porque todos são povo e, por isso, todos estúpidos) lhe apontem o dedo por uma decisão, uma crença, uma vontade que se verificou errada.
Sentado num bar, uísque de um lado, média do outro, cigarro a fumegar, eu olhava para um plasma que me mostrava cabo-verdianos a trocarem a bola ao som de "olés" vindos da bancada dos... portugueses. Podia ser a mistura de bebidas a provocar aquela alucinação mas, não, felizmente o uísquezinho aguenta-se bem sozinho, nunca se imiscuindo com sumos de cevada, e portanto aquilo que eu estava a ver na televisão era o que de facto, e inequivocamente!, estava a acontecer. Ora, isto é de uma boçalidade, de uma estupidez, de uma falta de amor e de conhecimento de futebol, isto é... parvo. É isto, é parvo, não há como dizê-lo de forma mais rigorosa. Um povo que enche um estádio pronto a assobiar a sua própria equipa se ela chegar ao intervalo empatada com Cabo Verde é um povo que não merece ser povo não merece ser nada. Merece ser o que é: um conjunto de atrasados mentais.
Mas esta atitude não é só do povo, também é de quem disto faz vida: jornalistas, opinadeiros, reporteiros, e muitos eiros que no fundo, e nem é preciso vasculhar muito, povo são. A ideia generalizada por aí é que a única dúvida que existe para o Mundial está consubstanciada na pergunta: "quantos é que levamos do Brasil?". Ora, isto é jornalismo de qualidade, é investigação, é imparcialidade, é conhecimento futebolístico como raras vezes vimos ou ouvimos a alguém. É que, se já tinham todos a certeza de que Portugal ia fazer má figura à África do Sul, agora as provas são inequívocas, bizarra e absurdamente comprometedoras: empatámos com Cabo-Verde num jogo de preparação! Que heresia! Que humilhação! Que desnorte!
Esta atitude é de um povo estúpido. Primeiro, porque não é minimamente fundamentada, apenas regendo-se por critérios fúteis, ignorantes e que não se coadunam com o que é uma natural preparação para um Mundial, onde muitas vezes interessa descobrir soluções, inventar recursos, explorar uns em detrimento de outros, com os jogadores com cargas de treino muitas vezes exageradas para os jogos em questão, na tentativa de que cheguem ao primeiro jogo oficial na máxima força. Depois, porque toda a gente que vê um jogo de Portugal, por mais que diga que só vê porque gosta de os ver perder, quer que Portugal ganhe. É uma coisa intrínseca, nossa, instintiva. Portugal é o nosso país, gostamos que faça boa figura, porque, sim, nós podemos dizer mal, humilhar os nossas, assobiá-los, mas não ponham os outros a fazer o nosso trabalho; aí, ai Jesus que vamos todos para cima deles, ganhamos brio, orgulho, sobe-nos uma chama por entre o peito e se for preciso empurramos os jogadores para a vitória, para a conquista, para os Descobrimentos!
É isto Portugal. É isto este povo. Da depressão à auto-flagelação ao orgulho exuberante. De um dia para o outro. De um segundo para o outro. Basta um golão do Ronaldo, uma bicicleta do Nani, de uma correria do Coentrão e logo a questão será:
"quantos é que o Brasil vai levar?"