domingo, 31 de janeiro de 2016

A criatividade de Pizzi

É importante falar de Pizzi, o jogador responsável pela melhoria no futebol da equipa. Com Jonas e Gaitán,  é ele quem garante a criatividade que desequilibra o bloco adversário.  São raros os jogadores criativos, aqueles que perante os mesmos desafios inventam novas soluções de jogo para jogo. Retirado da responsabilidade defensiva que tinha no miolo, Pizzi pode agora passear-se pelo relvado de forma mais livre, procurando sucessivas combinações colectivas, tendo, claro, em Jonas, o seu destino predilecto. Porque se conhecem, se reconhecem. Sabem a arte um do outro.


São Jonas

Já faltam palavras para a criatividade e bondade de São Jonas. Em todos os jogos novos brinquedos para os benfiquistas.


sábado, 30 de janeiro de 2016

Alberto Miguéns

"Lealdade ao SLB é dizer a verdade, honrar o passado, não é encobrir "maldades e maldadezinhas"; enganar os consócios"

quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Sobre vouchers


1) Serem considerados legais é, à partida, um descanso para qualquer benfiquista. Este é um clube que deve sempre ser fiel aos seus princípios de honestidade,  decência e seriedade;

2) Houve quem, representando o Benfica, tivesse dito e/ou dado dado a entender que era mentira que o clube oferecesse vouchers. Já estamos habituados a que as pessoas que representam o Benfica mintam aos benfiquistas; este foi só mais um episódio entre centenas de aldrabices por parte da "estrutura";

3) O facto de serem legais não os justificam. Pelo menos, à luz da ideologia benfiquista. Os árbitros ganham bastante bem, não precisam de ajudinhas de alimentação. Como sócio,  espero que os vouchers tenham acabado aqui.

4) Bruno de Carvalho, na sua saga anti-Benfica militante (que colhe naturalmente muita simpatia entre a maioria de sportinguistas), fez mais uma vez uma figura ridícula. O Sporting está transformado numa coisa sem sentido, lamacenta, paranóica,  odiosa. Tenho a certeza de que o meu avô, grande sportinguista, teria vergonha de ter um  Presidente tão baixinho.

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

E que tal irmos ao mercado buscar um médio?


Temos o Sanches (que é um puto que por mais qualidade que tenha, e tem, não deve ter um peso desmesurado em cima), temos o fraco Talisca (que ainda se safa a segundo avançado, no miolo é uma desgraça) e temos o Samaris (que é muito mais um médio defensivo do que um "8"). Vamos atacar os próximos meses, lutando por Campeonato e Taça da Liga e estando nos oitavos da Champions, só com esta malta? E se o puto se lesiona?

Vejam lá isso. Eu ia buscar um médio de grande qualidade, experiente, mais cerebral do que o puto, um gajo que entenda o génio do Jonas, o talento do Gaitán, a criatividade do Pizzi. Um gajo para fazer a diferença entre ganhar alguma coisa ou não ganhar nada.

segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Fizeste-nos mais Benfica

Hoje é o teu dia, Rei dos Reis. Foste de príncipe da bola de trapos e pés nus no chão até ao trono mundial viajando no talento, na vontade, no sonho. Impuseste o teu nome, a tua marca sobre o relvado; ensinaste a glória do golo e a ternura do abraço solidário ao guarda-redes adversário. Foste um de nós, foste mais do que nós. Foste Benfica, criaste Benfica. Fizeste-nos,  Eusébio, a todos nós, ainda mais Benfica.

Hoje estamos todos sentados à mesa contigo. E brindamos à tua eternidade.


quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

O Benfiquismo simiesco



Têm aparecido por aí uns vídeos do Diamantino a desmascarar personagens como o croqueteiro José Eduardo (também os temos, oh, se temos!) ou o sociopata Bruno de Carvalho (também temos disso, sim, sim!). O curioso é que o nosso Diamante agora tem sido muito elogiado depois de ter sido insultado de todas as maneiras e feitios em anos anteriores, quando era dos poucos que chamava a atenção para a falta de escrúpulos do mister Jesus.

É que o verdadeiro adepto, aquele que acha que gosta mais do clube do que os adeptos com cérebro, vive-o segundo a lei universal segundo a qual "defender o Benfica é defender todos os que representam o Benfica, independentemente das borradas que fizerem". É por isso que passa o tempo a fazer figuras de parvo, ora deixando que funcionários faltem ao respeito ao clube, ora defendendo precisamente o contrário um ou dois meses depois (basta que esse funcionário vá parar ao rival ou simplesmente deixe de nos representar).

Este tipo de adepto, que é o que mais existe, não tem qualquer ideologia além de duas:

- o insulto gratuito a tudo o que mexe decorrente de uma paranóia oligofrénica - está tudo contra o nosso clube: árbitros, fiscais de linha, jornalistas, polícias, stewards, fotógrafos, dirigentes desportivos, a UEFA, a morsa do Oceanário, a Comunidade Vida e Paz e, claro, os próprios adeptos do seu clube, os tais que levam dentro da tola um mínimo de neurónios.

- defender muito estupidamente que a defesa do Benfica se faz pela omissão,  pelo silêncio, até pela mentira. Há problemas? Não sabe nem quer saber, não pode é "dar armas aos outros". É por isso que "é preciso apoiar" seja lá o que isso for. As coisas "resolvem-se entre nós", temos de "cerrar fileiras". Portanto, quando o "Catedrático" - agora rebaixado a "Judas" - empurrou o Senhor Shéu era preciso "apoiar". Como? Fingindo que não aconteceu, que não foi nada de outro mundo; afinal, Jesus era nosso funcionário e nessa condição tinha liberdade de processos. E não só apoiar como, o que também é tido como grande sinal de apoio e defesa do clube entre os símios, insultar todos aqueles que acharam vergonhoso o treinador do Benfica andar a empurrar um homem com 40 anos de mística ao peito.

É assim o adepto sem cérebro: para "apoiar o Benfica", lá na sua demência de apoiadura, apoia tudo o que não é à Benfica que é para ninguém atacar o Benfica. E se, por acaso, numa ou noutra sinapse que lhe aconteça, acabe a ler este texto, ah é certinho, tira logo a conclusão evidente: "Este gajo não é um verdadeiro benfiquista!"

terça-feira, 19 de janeiro de 2016

Indiana Jonas - Em busca da baliza perdida


A expressão que faz o título deste texto é do Nuno Matos e não podia ser a melhor forma de começar a falar em Jonas porque o brasileiro é, ao mesmo tempo, um aventureiro pelos relvados e um descobridor de segredos perdidos. Às vezes parece que só ele tem o mapa que nos levará à baliza; a chave que abrirá a porta sagrada do golo.

Jonas é elegância em estado puro. Veja-se o porte altivo, pescoço estendido, cabelo arrumado, olhar aquilino. Movimenta-se pelo campo como se seguisse uma rota só sua, diferente dos demais - aquela que sabe poder chegar às redes adversárias. Jonas encontra o caminho da baliza por estradas invisíveis aos olhos dos mortais, rotas silenciosas, troços da realidade que só ele vê, que só ele sente, que só ele conhece.

O golo acontece a um determinado minuto mas na verdade o golo já aconteceu muitos segundos antes, quando Jonas correu para a bola e a recebeu e desenhou mentalmente o futuro da jogada e o presente da bola nas redes. Jonas joga futebol de 11 como se estivesse num pavilhão a jogar futsal. Trocas simples de bola, em movimento vertical recua ou sobe consoante a harmonia da harmónica colectiva. Faz de pivot, de placa giratória que tudo mete em movimento.

Nené com sotaque, nunca se despenteia, não se suja, não perde tempo com ninharias estatísticas - está ali para jogar futebol, não para fazer a maratona. Parece até alheado do jogo. Julgamos que Jonas estará pensando no que fará a seguir, se comerá peixe ou carne, que filme ver, qual a série que estará a dar na televisão. Quando a bola está em Luisão ou em Júlio César, é possível que Jonas, enfiado entre os centrais, vá dissertando sobre a maravilhosa poética na escrita de Guimarães Rosa, lembrando o não menos maravilhoso «Manuelzão e Miguilim» sob o olhar surpreendido de uma dupla de defesas que ainda não se apercebeu que a bola vai estar dentro da baliza exactamente daqui a 37 segundos.

Jonas já sabe que vai ser golo. Por isso vemo-lo agora a dizer as últimas palavras sobre o escritor brasileiro e a dirigir-se tranquilamente para a linha lateral, onde vai tabelar com o extremo, voltar para a grande área, dar um toque de calcanhar que vai isolar o médio em frente ao guarda-redes e depois simplesmente, já com a baliza perdida finalmente encontrada, agarrar na arca cheia de golos de ouro e distribuí-los pelo público. Vemos Jonas lançar para cada adepto um golo como se todos os adeptos de futebol merecessem um golo só seu. É esse o grande destino do nosso herói: inventar todos os dias um golo novo para oferecer aos benfiquistas. Porque é ele o centro do Universo do golo do Benfica.


Boçalidade

A reacção da maioria dos sportinguistas à piada de Marisa Matias explica muita coisa sobre os adeptos de futebol - no Benfica ou noutro clube seria exactamente igual. O futebol é amado maioritariamente por gente demasiado doente para rir de si própria.

Pastorinhos

Uma pessoa que acredita no "pé frio" de um treinador é uma pessoa que acredita em beber água para os adversários não marcarem golo ou que é verdade que Nossa Senhora de Fátima tenha aparecido em cima de uma árvore. Não tem nada a ver com o que o futebol é. Boa escolha do Porto.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Leonel Sergio Andrés

A Bola d'Ouro é um prémio que não faz sentido. Individualizar num desporto que é visceralmente colectivo é negar-lhe a sua essência: um jogo que é um equilíbrio constante entre bola, espaço, colegas e adversários.  Esta dança, esta procura constante pela melhor decisão,  este engano de puxar continuamente a bola para terrenos que favoreçam a progressão, isto, o bom futebol, não é quantificável num único jogador.

O craque não é contabilizável. Não são os títulos que a sua equipa ganha, a quantidade de golos que marca, as assistências que faz que o definem como craque. O craque é aquele que faz da sua técnica individual apenas um veículo de transmissão directa do que lhe diz o cérebro. O craque conhece e reconhece a movimentação dos outros a uma velocidade tal que o que faz tem sempre coordenadas definidas não por um qualquer computador ou um treinador mais científico mas pela sua própria interpretação da geografia. É esse farol, essa bússola mágica,  que lhe define o génio.

Não são números num quadro, gráficos para cima e para baixo, estatísticas. Isso são consequências daquilo que faz em campo mas isso não é o que ele é. Porque o que ele é pode, a certo momento e por razões várias, não gerar nas calculadoras mundiais números estratosféricos. Mas o que ele é persiste acontecendo no relvado. A sua capacidade de antecipar, de surpreender, de criar, de gerar a possibilidade do golo - atente-se: a "possibilidade do golo", nem sempre o golo em si -, é isso que o faz craque. É essa a razão pela qual deslumbra e faz sentido.

Não havendo forma de acabar com o espectáculo feérico que é hoje a entrega do prémio ao "Melhor jogador do Mundo", proporia que ao menos se começassem a premiar as parcerias dentro de uma equipa. Em vez de dar prémios individuais, passarmos a dar prémios aos melhores trios do Mundo. Por isso este ano a minha Bola d'Ouro vai para o Leonel Sergio Andrés.


segunda-feira, 11 de janeiro de 2016

Jonas, o tipo da foto




Este tipo da foto, além de ser o génio que é, consegue ser responsável por meter a nu a forma como se vê futebol em Portugal (diria no mundo, mas os outros que se resolvam). Este tipo da foto, esta preciosidade, este verdadeiro Vinicius de Moraes dos relvados, não lhe chegando andar a escrever poemas pelas Choupanas desta vida, ainda faz com que se destruam todos os mitos sobre o avançado "possante, agressivo e intenso" que querem vender aos adeptos que os compram e papagueiam como verdade universal. Só para continuar em campo, que é onde este tipo da foto gosta mesmo de viver, até marca muitos golos e faz muitas assistências. Só mesmo para meter um tampão nas bocas e elevar os cérebros.  Mas podia o tipo da foto não marcar nem um golo em 10 meses, que continuaria a ser o melhor jogador do Benfica. Estou tão agradecido por ter este tipo da foto a jogar de águia ao peito que até enlouqueço e grito:

OBRIGADO, VIEIRA!

domingo, 3 de janeiro de 2016

E depois da Jornada em Guimarães



O que fica?

Para começar fica o relançar do campeonato.

Estivémos a 7 pontos da liderança e a 5 pontos da vice-liderança mas agora, pelo menos neste contexto, parece tudo bem mais optimista.

Neste momento estamos a 2pts do Porto e a 4 do Sporting. Além disso, também já afastámos o possível fantasma do Braga.

O calendário não está fácil mas a verdade é que, apesar de faltar ir a Alvalade, já fomos ao Dragão, Braga e Guimarães.

O mais triste disto tudo é o mais positivo ser o facto de terminarmos esta jornada só a 2 e 4 pontos dos nossos rivais.

Este negativo positivo é o que nos permite ainda sonhar. Estar a 2 pontos do Porto de Lopetegui e a 4 do Sporting que é Sporting, é péssimo mas mantém as esperanças bem acesas.

Desta jornada fica também um Benfica sem futebol. Fica um Benfica sem ideias. Fica um Benfica frágil defensivamente. Fica um Benfica fraco ofensivamente. Fica um Benfica perdido sem bola. Fica um Benfica previsível com bola.

Fica um Benfica dependente da inspiração das individualidades.
Fica um Benfica que pode ganhar por ter melhores jogadores que os adversários.
Fica um Benfica irreconhecível.

Foi um jogo onde tivémos a sorte da arbitragem, um jogo onde jogámos contra um adversário de contra-ataque e que tem feito um fraco campeonato, e foi um jogo que se decidiu aos 75 minutos com um duplo remate do puto Sanches.

Muito, muito pouco.

O nosso melhor período foi os primeiros 20 minutos. Tivémos mais bola, levámos o jogo maioritariamente para o meio-campo adversário e parecíamos estar a conseguir controlar as saídas vimarenses. Contudo, tudo isto só resultou num remate de longe do Renato.
Após os 20 minutos inicias começámos uma péssima exibição. Oportunidades foram 2 para cada e depois lá surgiu a dupla bomba que forçou o golo e a vitória neste jogo.

Talvez para aquilo que o Guimarães treina, quer, tem e é, consideram ter feito uma boa exibição.
Agora, para nós, Sport Lisboa e Benfica, Bicampeão Nacional, isto foi um jogo desesperante.

Custa-me não ver uma evolução relevante no nosso futebol. É isto que o treinador quer? Ou simplesmente não consegue passar a mensagem?

Deste jogo ficaram os 3 pontos e a certeza que nas próximas jornadas andaremos sempre com o coração nas mãos.

Quando o sistema de jogo está quebrado, quando os processos tácticos estão tão entalados, fica quase impossível analisar as performances dos jogadores.

O individual salva o colectivo que o condiciona.

Um organizador de jogo não organiza sem linhas de passe.

Um avançado não faz a diferença na área se a bola lá não chegar ou se constantemente tiver de recuar.

Um central não pode corresponder posicionalmente perante recorrentes desequilíbrios defensivos.

A nossa equipa está demasiadamente dividida. Há uma exageradamente visível sectorização dos jogadores. Jogamos com posicionamentos e progressões em linhas paralelas que comportam entre si profundos buracos de acção e intervenção.

Apesar das muitas criticas que tenho lido ao Lisandro, vejo-o mais como vítima de um colectivo lento e partido.

Considero como catastrófica a dinâmica colectiva da nossa dupla de meio-campo.

É fácil elogiar o Renato pela idade que tem, por vir do Seixal, pelo seu esforço, força e por ter resolvido o jogo. Marcou e tentou muito mas sinceramente não gostei nada da exibição dele. Culpa própria? Também mas não só.

O regresso do Luisão até pode não acrescentar qualidade individual mas irá certamente proporcionar uma melhor organização e atitude defensiva à equipa.

Todos os outros regressos – do Nico à melhor forma, do Salvio e do Semedo – e aquisições – Cervi e Grimaldo – não vão resolver o problema deste Benfica.

A qualidade individual vai aumentar e assim ficará menos complicado resolver os jogos do modo como já têm sido resolvidos.
Os remates de longe vão melhorar, os cruzamentos vão melhorar, a velocidade das alas vai aumentar e a capacidade de último passe vai melhorar.

Vencer tem de ser sempre positivo. O problema é quando as vitórias são mentirosas e podem levar certas pessoas a acreditar nessa mentira. Vencemos mas jogámos muito mal e há muito que tem de mudar. Só posso acreditar que no Benfica quem lidera o Futebol saiba ver além do resultado final.

Esta Quarta estarei no estádio na expectativa de ver muito mais que uma vitória. Estarei no estádio com a exigência de ver uma clara evolução que nos demonstre haver capacidade para ganhar não só este jogo como todos os que o seguem.


sábado, 2 de janeiro de 2016

DANÇA E FUTEBOL: A COREOGRAFIA DE UM ATAQUE MÓVEL


No relvado ficam marcas invisíveis da movimentação dos jogadores; parábolas,  diagonais, círculos quase perfeitos, gráficos cardíacos, sprints em linha recta paralelos à lateral. Se, em vez de preferir ouvir a voz dos jogadores ou o som que as gotas de água fazem quando embatem na garganta de Rui Vitória, o adepto escolher um lugar mais alto, com melhor vista, mais abrangente paisagem, vai então ficar atento à dança colectiva e individual que o jogo lhe proporciona.



O futebol é dança.  Cada vez mais uma dança moderna, sem pontos fixos nem posições a que fiquem agrilhoados os jogadores. O jogo evoluiu para um espaço de liberdade de que já não sairá, exceptuando quando é pensado e treinado por quem ainda pensa que a dança só faz sentido se o palco tiver marcações a anunciar aos bailarinos o lugar onde devem estar em determinado momento.  Isto não significa que não haja indicação de zonas estáveis por onde começar o bailado, locais vastos de onde se parte para que a sequência seja feita toda ela livre de quaisquer amarras posicionais. O jogo pede áreas longas e largas, referências apenas zonais para favorecer o colectivo, povoar o espaço inimigo em estratégia inesperada.

Na última edição do Jornal de Letras, lemos Daniel Tércio versar sobre dança enquanto traça, sem o saber, o futuro do ataque móvel no futebol: 《Mas o que importa neste caso – e esta a razão deste texto – é que Cunningham, em meados do século XX, adoptou a epígrafe de Einstein “não existem pontos fixos no espaço”. O coreógrafo norte-americano declarou aliás a este respeito: “eu decidi abrir o espaço para o considerar por igual, em qualquer lugar, ocupado ou não,  tão importante como qualquer outro. Num tal contexto não temos que nos referir a um ponto preciso no espaço. Se não existem pontos fixos, então cada um dos pontos é igualmente interessante e igualmente mutável.” Segue discorrendo Tércio sobre a importância da mobilidade livre: “Com Cunningham algo de novo acontece, uma vez que uma sequência não tem que estar condicionada a outra, podendo tudo ser constantemente deslocado, tornando o movimento contínuo.”



O jogo há muito vem dando esta lição evolutiva.  Grandes equipas com grandes treinadores têm testado e voltado a testar com sucesso a possibilidade de uma utopia realizável. De um lugar de ultra liberdade. Nesse espaço em que a primazia vai inteira para a qualidade de movimentação,  para a criatividade individual e colectiva, para a inteligência com que se enfrenta o adversário, características físicas perdem a sua importância e dão lugar ao que verdadeiramente valoriza o bom futebol: cérebros craques em vez de caparrudos “agressivos” e “muito intensos”. Na mobilidade de um futebol sem pontos fixos, o central pode ser um anão, o extremo só ter uma perna, o avançado não ter força para rematar, o médio sofrer de reumatismo. Fundamental é que o treinador seja intenso e agressivo a pensar.

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

UM NEGÓCIO DAS ARÁBIAS

Assisti ontem de manhã a uma das cenas mais surreais de que tenho memória. Por isso, e por me ter alegrado o dia de forma surpreendente, resolvi partilha-la aqui convosco, para começarmos o ano em beleza. Depois me dirão se lhe acharam tanta graça como eu achei. Vou tentar que a descrição seja o mais fiel possível, de forma a pintar o quadro com as suas verdadeiras cores. No final, acredito que vão ficar tão incrédulos como eu ainda me encontro.

Sentei-me no Frutalmeidas da Avenida de Roma para tomar um pequeno almoço tardio. Um belo de um copo de sumo depois, ia já no segundo pastel de massa tenra quando reparo na mesa da frente com mais atenção. Confesso-vos que não tenho por costume ouvir propositadamente as conversas dos outros, mas este grupo era ostensivamente espalhafatoso. Sem qualquer desprimor para a profissão, diria que toda a dinâmica de interação dos seus elementos era algo apalhaçada. Chegava mesmo a ter traços de um número de Vaudeville.

Da primeira vez que reparei neles, pareceu-me ver um grupo de gente vestida de forma perfeitamente normal. Mas ao fim de pouco tempo notei que estavam todos com uns óculos à Groucho! Vocês conhecem esses óculos de que falo, com certeza. Com um bigode e um nariz enorme na ponta? Sim? Pois podia jurar que não os estavam a usar segundos antes.
Este pormenor deixou-me alerta. O resto das roupas era completamente normal. Pelo menos até ao momento em que me virei para o empregado durante dez segundos, não mais, para pedir outro pastel de massa tenra. Quando me volto de novo para a mesa, reparo que agora um deles envergava uma daquelas faixas presidenciais, que vemos frequentemente nos presidentes da América do Sul. O pormenor mais curioso era mesmo uma miniatura que ostentava na faixa. No lugar da roseta surgia uma réplica de uma mesa de matrecos, tapada por um plástico transparente. Daqueles plásticos próprios para não deixar saltar as bolinhas, sabem do que falo? Isto é surreal, reconheço, mas juro-vos que é tudo verdade. Estas pessoas mudavam de aparência com a facilidade de um truque de televisão. A minha atenção estava ganha. Não ia descolar mais o olhar da palhaçada, por um segundo que fosse.

O estranho grupo era composto por três membros da direção de uma equipa feminina de matraquilhos e por dois empresários, com os quais se decidia, naquela altura, um futuro patrocínio do clube. Ao que percebi, queriam arranjar à força um valor superior ao do clube rival, o clube com mais títulos lá do bairro. Até esse momento, digo-vos que desconhecia toda esta problemática em torno dos matrecos. Nem tão pouco sabia que existiam equipas femininas da modalidade, quanto mais que estas eram patrocinadas.

O presidente do clube (o tal que envergava a faixa!) era um tipo entroncado, com uma voz rouca e de risco ao lado. Falava com uma entoação cómica, meio afetada. Para vos poder situar melhor, nos diálogos que se seguem imaginem um pseudo beto da linha, sem a educação, mas com todos os maneirismos ampliados. Todo ele em cómico, todo ele em bom! Sentava-se ao lado de dois lacaios, o Zé Inácio e o Zé Otávio. E argumentava com os futuros patrocinadores, donos de uma oficina de bicicletas. Como já referi, queria à força obter uns euros a mais do que os rivais. Os senhores das bicicletas diziam-lhe que não, Presidente, não dá, o seu clube não tem a dimensão do outro, nem lá perto. Pode esquecer. Ninguém lhe vai dar mais do que nós oferecemos, Presidente.
Mas o Presidente não se dava por satisfeito. Limpou o bigode de plástico com um guardanapo e pediu mais um copo de sumo ao empregado. Olhou para os patrocinadores, como quem domina todos os esquemas possíveis, e avançou com uma contra proposta.

—Oiça, amigo. Nós não podemos ficar atrás do nosso rival, percebe? Temos que engan… bom… temos que mostrar aos sócios que somos tão grandes ou maiores do que os outros. Senão vamos perder a cara, está a ver? Os nossos doze associados vão ficar fulos da vida, e com razão. Já lhe disse que somos pela transparência? Não? Pois digo-lhe agora que somos o único clube de matraquilhos nessa cruzada, contra tudo e contra todos, percebe? Nós somos especiais, entende? Olhe, vamos tornar a proposta mais aliciante para o vosso lado. Parece-lhe bem? Vamos negociar também a cedência de direitos de imagem de algumas partes do corpo deste meu capach.. quero dizer, deste meu colega de direção. O que me diz se juntarmos aqui o rabo do Zé Inácio como extra? Deve dar para acrescentar pelo menos… vá, sei lá… mais uns cento e cinquenta paus ao bolo, não será assim?

O desgraçado do Inácio, que bebia nesse preciso momento um pouco de sumo de jaca, mal podia acreditar naquilo que estava a ser dito sobre o seu traseiro, para lá dos insólitos óculos. O pobre acabou por não conseguir engolir o sumo, que cuspiu integralmente no chão de calçada. Os outros quatro elementos do grupo levantaram os oito pés, em uníssono, para os baixarem logo de seguida, sonoramente. Parecia um número muito bem ensaiado, garanto-vos. E, nessa altura, a coisa ficou ainda mais interessante. Os sapatos, afinal, já não eram assim tão normais. Eram pretos, sim, mas muito grandes. Muito maiores do que os pés! E todos com as solas meio descoladas. Abanaram também em uníssono.
Ainda incrédulo e de olhos esbugalhados, Inácio balbuciou como pôde.  O meu rabo, Presidente? Mas… mas o meu rabo não! Não, senhor presidente, o rabo não. Tenho dito!

—Esteja calado Inácio, oiça. É pelo clube. O clube acima de tudo, Inácio. E é só para a fotografia, homem, estes senhores vendem selins, tá a ver? Shôr empregado! — exclamou, de dedo esticado — tenha a gentileza de trazer outro copo de sumo de abóbora aqui para o Inácio.

Nesta altura a conversa não corria como o Presidente queria. O rabo do Inácio não estava a ter a melhor recepção do lado dos patrocinadores, habituados aos grandes modelos para a promoção dos seus selins. E o Presidente decide virar mais uma carta.

—Bom, temos outras propostas para os senhores. Escolham alguém para morder. Eu mando o Zé Otávio morder uma… vá, duas pessoas à vossa escolha. Antes de responderem, reflitam bem na minha proposta. Duas pessoas. À vossa escolha. A quarenta euros a mordidela, vá, vezes dois… bom…isto é… vá, mais cem euros e não se fala mais nisso. Brindamos à proposta?  Otávio, o que é que acha disto? Posso mandar vir o sumo de tomate, para selar o negócio?

Eu garanto-vos que, até este momento, Otávio tinha uma estatura perfeitamente normal. Ficarão, por certo, tão descrentes como eu fiquei com aquilo que vos vou revelar. O Otávio era anão! E, até aqui, tudo bem. Não seria de estranhar esta sua condição de tamanho reduzido. A questão é que, segundos antes, Otávio não sofria de nanismo. Alterou, por artes mágicas, não só a estatura como também o figurino, num piscar de olhos. Em vez do fato, vestia agora um casaco largo, em xadrez amarelo e laranja, com as mangas muito curtas, quase pelo cotovelo, deixando bem visível uma camisa de flanela azul e branca. Gesticulava com fartura, depois de espicaçado pelo presidente. Dizia alto que sim, que mordia, claro que mordo, quantos são? Mordo já o Jojó, carago, odeio o Jojó Juju. Passa a vida a gozar connosco, esse farsante.
O presidente chamou-o a si.

—Ouça, Otávio, o Jojó Juju agora é dos nossos. Lembra-se? Os outros é que são maus, o Jojó virou o paletó ao contrário, está recordado? Agora é dos bons.

Otávio sacudiu a cabeça com movimentos rápidos, durante uns segundos, como quem reclama alguma racionalidade. Enquanto o fazia, pude ouvir, distintamente, o barulho de um chocalho. Não vi o chocalho, admito, mas escutava-o perfeitamente. Devia ser um daqueles chocalhos imateriais da UNESCO.
O Jojó Juju? disse, muito rapidamente. O Jojó é uma pessoa maravilhosa, Presidente. Só lhe encontro virtudes. É um Ser fantástico, presidente!

Nesta altura, e por indicação do Presidente, Inácio tira uma tuba enorme do bolso. Não me perguntem como é que a tuba foi parar dentro daquele sobretudo roxo com bolinhas castanhas, porque eu, neste momento, nem sequer consigo justificar o aparecimento do sobretudo! O facto é que ela apareceu assim, do nada. E que bem que tocava Inácio. Começou a fazer uma belíssima linha de baixo, que manteve nos minutos seguintes, sempre em crescendo, aumentando desta forma o suspense do final da parada, que se aproximava. FOHM-POHM-POHM-POHM, FOHM-POHM-POHM-POHM
A Inácio juntou-se também Otávio, com um ukelele que tirou de uma daquelas malas de executivo com código. E passámos a ter harmonia, com quatro cordas. TINGERLIHM-DIHM DIHM,  TINGERLIHM-DIHM DIHM. O presidente joga todas as cartas que ainda possui, e passa a cantar as propostas. Avança com a mãe, e com o pai também. Com a coleira do Cabeçudo, o seu belo gato felpudo. FOHM-POHM-POHM-POHM, toca Inácio. TINGERLIHM-DIHM DIHM, acompanha Octávio.

—Noto que os senhores patrocinadores não me tomam as dores. Percebem agora que o clube dará tudo o que tem e o que não tem, como vos convém. Têm que entender que eu só não quero ficar mal, quero passar à frente do nosso rival!

Octávio complica os acordes nesta altura, omitindo a tónica e a quinta, que são brilhantemente dadas por Inácio, e faz extensões como pode. A estrutura impõe-se.

—Ofereço-vos um tuc-tuc com três passeios, conduzido por uma mulher de belos seios. Deixem-me tornar o momento musical mais engraçado, enquanto seguro neste berimbau dourado. Agora, sempre que os senhores torcerem o nariz a uma nova proposta, o berimbau ira soar em vossa resposta. BOIN-OIN-OIN-OIN-OIN-OIN.
Seguem-se então um par de meias e umas calças de pijama muito feias — BOIN-OIN-OIN-OIN-OIN-OIN — mas são quentinhas, ora bolas. Uma campainha das antigas, a funcionar? Um disco de velhas cantigas, por estrear? Um corta unhas e este canivete suíço. Como? Não valem um piço? — BOIN-OIN-OIN-OIN-OIN-OIN — Dou-vos licor de tangerina e uma camisa muito fina. Um ferro de engomar, que se recusa a funcionar, mais um belo de um brasão, que é todo feito à mão. Do Otávio, cedo-lhe as cuecas, e do Inácio a sua coleção de bonecas!!!! Cedemos toda a publicidade à volta da mesa de matraquilhos e ainda as camisolas suadas das nossas jogadoras para os vossos filhos. Pintamos os bonecos com as vossas cores, e assim. Até os pomos sentados, em cima de um selim!—BOIN-OIN-OIN-OIN-OIN-OIN.

O desespero é cada vez mais evidente na cara do presidente, que decide jogar a derradeira cartada.

—Já vos falei que somos os maiores defensores da transparência nos Matraquilhos? E se eu vos cedesse a transparência?

Depois desta quebra de rima, fez-se silêncio absoluto. Octávio e Inácio tinham parado de tocar, perante a antecipação da oferta. A tampa não, presidente. Tudo menos a tampa. É aquilo que nos define, Presidente, aquilo que nos torna tão diferentes, tão especiais.

—A rivalidade acima de tudo, meus queridos lacaios. E agora, senhores patrocinadores? O que me dizem? Cedo-vos a tampa transparente, para adaptar em cima de uma mesa de matraquilhos. Já lhes tinha dito que somos os únicos defensores da transparência? A transparência acima de tudo, meus caros! Então? O que me dizem?

E assim se fez o negócio e veio bebida e comida para todos. Os patrocinadores estavam em delírio. Ficaram com os  direitos sobre tudo o que podia ter algum valor. São os verdadeiros donos do clube. E excederam a proposta do rival nuns míseros cem euros e um selim. Dos mais baratos. 

No meio desta confusão de sumos e pasteis, com o Presidente a ajeitar a faixa e o cabelo, chega um terceiro lacaio, que tinha estado à procura de um lugar para o carro durante todo o tempo da negociação.

—Ó Zé Eduardo, só agora é que você chega? Para a próxima vem você ajudar-me e fica o Inácio encarregue de arrumar o carro. Recusou-se a ceder os direitos de imagem do rabo nas negociações, acredita? Ao menos o seu está sempre disponível.


E foi de lá, bem do meio de toda essa disponibilidade, que o Zé Eduardo tirou um sax tenor, juntando-se ao resto do grupo. Sairam em êxtase do Frutalmeidas e foram a celebrar o negócio pela rua fora, tocando e dançando, e com um novo e adequado figurino. Estavam todos vestidos de árabe.