segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Dificilmente não seremos vice-campeões

Estou dorido. Doem-me a alma e o corpo na mesma medida. Dormi mal, tive pesadelos, acordei durante a noite, readormeci. Sempre aquele número, 5, a martelar-me na cabeça, as jogadas de perigo, os golos, tudo numa confusão de sono e sonhos. Acordei.
Este terramoto exibicional irá ser acompanhado pela incontornável crítica: desde a mais lógica à mais absurda, iremos ser presenteados com um verdadeiro desfile de questões e problemas, de gente que adivinhara a hecatombe, de outra gente jurando que até os seus filhos fariam melhor que Jesus. A todas elas, num período de uma semana, por mais pífias que pareçam (e sejam), teremos de dar guarida e acarinhá-las: elas vêm da dor.
Haverá, no entanto, duas vertentes críticas distintas: as dos emotivos, que defenderão à exastão que a mudança de David Luiz para a esquerda foi a única e crucial razão para a tempestade e a dos táctico-existencialistas, que aprofundarão no plano mental (fraco) da equipa as suas opiniões, desacreditando ter sido por David Luiz que Hulk exerceu os seus poderes de super-herói azul.
Situo-me exactamente a meio, no ponto geodésico de todas as explicações. Revejo o meu post de ontem à tarde, lembro-me da frustração de o ter visto confirmado aquando da apresentação do onze e tenho pesadelos quando me lembro das coisas que chamei a Jesus durante o jogo. Naqueles 90 minutos, eu justifiquei a mim mesmo 50 razões para eu dever ser o treinador do Benfica e não o mestre da táctica da Reboleira. Mas, como quase sempre, estava errado. O Benfica não perdeu daquela forma apenas e só por ter deslocado David Luiz para a esquerda - ajudou e muito ao descalabro mas o desfecho final deve as suas origens não a uma opção pontual de Jesus mas a Julho e Agosto e à arrogância de dirigentes, treinador e jogadores de um clube que, infelizmente, está pouco habituado ao sucesso.
Recuemos então a esses meses fatídicos em que tudo brilhava para os lados da Luz: Jesus dava uma entrevista em que, no meio de um chorrilho de asneiras e falta de humildade, declarava dois pontos essenciais: o Benfica era candidato sério a ser campeão europeu e, cá no burgo, "dificilmente não seremos bicampeões". O mote estava lançado! Aos benfiquistas em êxtase, pouco habituados ao manjar que tinha sido oferecido na época passada, deram-se-lhes uns ares, uns afrontamentos de megalomania e alucinação: se Jesus diz, nós rezamos!, e começava assim a onda vermelha para o tsunami azul que encharcou os benfiquistas com um banho de bola na noite de ontem.
Com um mês de competição oficial, a dúvida instalava-se no coração dos adeptos: o que se passa com esta equipa? O modelo era o mesmo, as peças que entraram, não sendo da qualidade das que saíram, eram mais que suficientes para manter um registo de qualidade e no entanto a equipa parecia outra. Qual a razão?, questionavam de coração apertado, os benfiquistas, esquecendo que o plano mental foi, é e será sempre um dos motivos para a liderança vitoriosa. Ao Benfica não chega, nunca chegou, ter bons jogadores, o que fez a História deste Clube foi a capacidade de transcendência, muitas vezes com equipas inferiores à que hoje temos. Não chega dizer: vamos ser campeões; chega não dizer e agir como tal dentro de campo, como no ano passado em que, mal o primeiro pontapé na bola era dado, era ver os jogadores sedentos de glória, capazes de se superarem a cada momento.
Ora, uma política para o exterior (e interna?) baseada na bazófia e na frase populista, impregna todos os agentes desportivos desse mal e geralmente limita as suas capacidades. O Benfica, de facto, parecia o mesmo, tinha tudo para ser o mesmo, mas não era. E não será. Esqueçam o ano que passou, esqueçam as vitórias, goleadas e futebol de sonho com que se lambuzaram porque é agora, aqui, neste momento, que temos de estar todos concentrados. E ele é mau. Não por falta de qualidade, que é muita, mas por falta de humildade, de superação, de noção bélico-competitiva. Os 3 golos sofridos contra o Lyon, a derrota de ontem, a derrota na Alemanha não foram momentos de azar nem de má arbitragem, foram a sequência lógica de um discurso eufórico desfasado da realidade.
Por isso, meus senhores, podem vir com a conversa do David Luiz à esquerda e do Saviola no banco, podem dizer - e eu estou convosco - que ontem Coentrão deveria ter jogado como lateral. Mas tenham presente que o que fez ontem o Porto ganhar e o que fará o Porto ser campeão não é o Hulk jogar à esquerda ou à direita: é a qualidade dos seus intérpretes (que nós também temos) alicerçada numa vontade de ganhar (que nós também temos) e, de forma humilde, saber aproveitar o sucesso para construir um hábito. Que nós não temos.

16 comentários:

PalCba disse...

Boas,
É tipo os da meia-idade pra frente que não conseguem dar duas seguidas... Fdx

Ricardo disse...

Estou eu aqui com textos longos e tu chegas-me e resumes isto tudo nessa frase! :)

Muito bom.

PalCba disse...

Já agora,

Ricardo o teu pc deve ter um virus ou pior, pois estás a enviar-me, com alguma frequência, mail para o Gmail com bichos... :)

Ricardo disse...

Sim, tive vírus. Desculpa lá esses Jorge Costas...

Anónimo disse...

estamos com saudades tuas, aparece

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
JNF disse...

Não estou assim tão esperançado. Ao sporting, quando cheira a segundo lugar, aqueles gajos transformam-se. Cuidado, parece patético, mas já vi nos últimos anos 3 Benficas superiores a estes monos conseguirem acabar atrás do Sporting.

Ricardo disse...

JNF,

Não me parece. Claro que vai depender de como a equipa sair desta goleada em termos mentais mas a diferença de qualidade para a equipa do Sporting é tão grande que, mesmo mal em termos de confiança, mais cedo ou mais tarde teremos almofada confortável. Neste momento, preocupa-me mais o Braga e o Guimarães do que o Sporting, com toda a sinceridade.

Anónimo disse...

última hora: visita dos mineiros do Chile a Portugal.
objectivo: ajudar os gayvotas a sair do buraco.

Anónimo disse...

Enquanto me deixei andar pelo contorcido turbilhão que é a blogoesfera benfiquista, sempre te encarei como um dos alguéns mais próximos com a forma como penso o Benfica. E agora, que quase tive vontade de voltar a escrever qualquer coisa, sei que começaria assim: “Estou dorido…”. E é assim que também começaste. E pelo meio foste escrevendo o que penso. E acabaste da mesma forma como me apetecia acabar.

De facto, este foi um resultado que ultrapassa tácticas e equívocos, foi mais uma derrota da sobranceria e da convicção induzida de que tudo o que está mal no Benfica se encontra lá fora. Foi a derrota das gentes que se deixam convencer, mesmo que lhes vendam um mundo que não lhes cabe nos bolsos.

Quando tínhamos tudo para ser dominadores esta época cá em Portugal – repito, cá em Portugal – arriscámos cimentar esse domínio por um sonho colado com cuspo de nos fortalecermos “na Europa e no Mundo”. E quase todos de nós acreditámos, mesmo quando após os primeiros jogos da época denunciavam uma coisa destas, mais tarde ou mais cedo, e as desculpas foram servidas a quente e a frio para quem as quisesse engolir a seco, sem a ajuda de algo mais líquido que pudesse prever este engasgo. Agora já se fala em despedir Jesus, entregando, de novo, a alma aos novos velhos demónios. Enfim…

Posto isto:

já li o que tinha a escrever (em melhor, claro);

penso que escreveste o que muita gente deve e deveria ter lido há algum tempo;

já escrevi o que queria que lesses.


Um abraço

Carlos Silva

(ex- Leão Eça Cana)

Sérgio disse...

Pois, concordo com o Carlos Silva; não consigo tecer considerações sobre este assunto sem pisar no teu texto. Está tudo dito, muito bem dito, mas era importante que fosse repetido, uma e outra vez.

Quanto ao diferendo que corria por aqui entre ti e o JNF, parece-me que o sporting já se encarregou de te dar razão!

Abraço

Ricardo disse...

Abraço, Carlos!

Não te tenho lido nada. Fazes falta.

Em relação ao que dizes, obviamente concordo com tudo. Como é costume.

Ricardo disse...

Sérgio, o Sporting, como é seu hábito, vive na sombra do Benfica. "Ah aqueles gajos mamaram 3 golos em 15 minutos? Nós também conseguimos, ora porra!".

Esqueceram-se foi do facto de que só tinham marcado 2. São de uma falta de estratégia terrível.

Anónimo disse...

não me tens lido nada pq eu não tenho escrito nada (agora, tal como dantes, vivo o meu Benfiquismo na solidão que mais me conforta ;)

mas tb,e felizmente, já há por aí - aqui - mta gente, e cada vez mais gente, a pensar o que eu gostava de escrever

agora faltam começar a desentorpecer as fisgas os "caçadores de abutres" para que isto fique mais animado, pq cada vez mais aparecem mais "abutres" a contestar os "pombos correios" de quem deita milho para o pombal da águia

vamos a eles! que o benfica é um céu onde devem voar todas as aves - de preferência rapináceas - e não um barracão com cheiro a mofo, cheio de aves com papos pequeninos, à espera de sementes envenenadas e ratazanas que engordam com os borrachos que se aprestam a lhes a sustentar o pelo, sem honra no sacrifício

:)))

;)

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
Ricardo disse...

Não faças isso, não abandondes o barco, a Tertúlia precisa de ti, O BENFICA PRECISA DE TI! :)

Quanto aos pombos-correio, eles são muitos, é verdade, mas ainda quero crer que o que move uns e outros é a paixão ao Benfica.

É preciso é saber aceitar as diferentes visões que cada um tem para o nosso clube. E isso nem sempre acontece.