terça-feira, 17 de julho de 2012

O fim da história?


Estive recentemente em Barcelona.

Ora, Barcelona – a cidade – e Barcelona – o bastião da cultura catalã – e o Barcelona – o clube – misturam-se. Arrisco-me a dizer que estão intimamente ligados, o que parece óbvio, mas não é. Afinal, que clube e respectiva cidade estão assim tão ligados, entre si e à sua história?

O Barcelona é fascinante porque soube sempre conservar a sua identidade, de tal maneira que conseguiu o que apenas poucos conseguiram: marcar um período, um estilo na história do próprio jogo. Saber evoluir dentro da própria história só se faz à custa de uma identidade muito forte porque, é preciso não esquecer, ocorre também quando se perde. Este Barcelona germinou durante os galácticos. É a resposta, catalã, blaugrana, curiosamente em sentido contrário – o que legitima essa identidade – ao reinado de conquistas das estrelas de Madrid. Impressionante, não? Assim se faz história e se cria um mito, uma lenda, muito mais do que com vitórias (mas também!).

O Benfica também tinha a sua história. Não serei talvez a melhor pessoa para a caracterizar, mas sei que deixa de existir se ao mesmo tempo esquecermos antigas figuras, demolirmos o estádio, destruirmos a formação e esquecermos o jogador português, ou pelo menos lusófono. Desaparece também se negarmos os nossos valores, se estes passarem a ser os mesmos dos nossos adversários. Contrariamente ao Barcelona quando confrontado com o domínio do Real, nós, Benfica, como reacção ao Porto soubemos apenas imitar. Cópia barata suponho, dada a ausência de resultados…

Do que era o Benfica, não resta nada, ou quase nada. Esta é a triste realidade e a verdade que poucos pretendem enfrentar, perdidos que estamos entre emersons e witseis da vida. Não se fala disto tal como não se fala do cancro terminal de um familiar, fingindo que a realidade deixa de o ser. Muitos outros não o discutem porque, pura e simplesmente, nas estruturas dirigentes do Benfica, nos notáveis que em seu torno orbitam, na imprensa da especialidade e nos blogues não existe a capacidade dialéctica de enxergar para além dos rojos e djalós. Alguém aqui consegue defender que o LFV compreende ou alguma vez compreendeu a história do Benfica, a sua identidade? E tu que não dizes benfas, compreendes?

O Benfica acabou, e acabou porque o seu presidente e a sua trupe não conhecem a sua história, acabou porque o seu treinador não tem respeito pela sua história, acabou porque nem o seu estádio lhe conhece a história, acabou porque os seus adeptos lhe quiseram esquecer a história, traumatizados que estavam com a mais recente. Mas é importante perceber – não acabou por nenhuma destas razões – acabou por todas elas, juntas, aliadas numa ausência de ponte para o passado.

O vosso Benfica, o Benfica pequeno como o Porto, do LFV e dos adeptos que não dizem benfas mas sim melhor do mundo (sem o ser!), esse será eterno. Ficará sempre, imponente mas vazio, como o coliseu em Roma, lembrando um passado e ganhando umas taças e campeonatos, perdendo outros, sem glória europeia, mas com “plantéis que nenhum clube europeu desdenhará” – esse ficará. O outro morreu, já ninguém fala nele.

18 comentários:

Rui Oliveira disse...

Se existe coisa que não tem faltado é relembrar o passado do Benfica. Na BenficaTV com o programa Vitórias e Património. As constantes homenagens aos campeões europeus. O nosso símbolo nas duas ultimas épocas a relembrar os 50 anos da vitória na Liga dos Campeões, etc. Exemplos de recordações do Benfica não faltam.

Quanto a estádios eles não ficam em pé para sempre. E a história neste novo vai-se fazendo aos poucos com jogos como o do titulo em 2004/2005 contra o Sporting, os jogos contra o Manchester ou Liverpool na Liga dos Campeões de 2005/2006, etc. A história faz-se todos os dias.

Mas o que foi das piores coisas que li é dizeres que o Benfica é um clube pequeno como o Porto. Podes não gostar do nosso rumo mas não podes comparar o Benfica com um clube que faz da corrupção a sua melhor arma. Para além dos jogadores emprestados não sei em que é que copiamos o Porto. E mesmo isso teve de ser algo necessário para evitar passeios do Porto em mais de metade dos jogos da época. Quanto ao resto parece-me é que todos copiam o Benfica, sem excepção. BenficaTV, Fundação, Kits de sócio (que fez com que sejamos o clube com mais sócios do mundo, ainda por cima dos países com menor poder económico) não foram copiados por ninguém.

Para mim o Benfica de antigamente continua a ser o de hoje. A grande marca do Benfica sempre foi a sua massa adepta que está em todo e qualquer lugar do planeta. Uma massa adepta que aparece em qualquer campo onde a equipa jogue. Uma massa adepta que para além de ser imensa é especial. Basta olhar para os outros em Portugal que fazem da sua doutrina o insulto ao Benfica. A nossa faz a festa sempre a torcer pelo nosso clube. As vitórias não são as de antigamente por causa do período negro por que passamos. Período em que também não deixamos de ser o Benfica.

O Benfica está VIVO. Cada vez mais. Desde os anos 80 que não demonstrava a sua força como demonstra agora.

BENFICAHEXACAMPEÃO disse...

Os que podem são chamados a fazer ressurgir uma vida nova... ou fazer do velho novo!
Eles existem... esses homens com paixão e coração...eles existem!

dosul disse...

Sérgio,

Trocaste um pequeno, mas importante pormenor na análise disto tudo, e é que o Benfica é o Real Madrid e o Porto o Barcelona. Olhar para o Barcelona como o "super sumo" de tudo é um erro.Lembro que é um clube que "matou" o futebol da Catalunha , à imagem do que o FCP fez no Porto.


Fora isso, por mais que o Benfica esteja minado de não benfiquistas, ladrões e incompetentes, dizer que o Benfica está morto é o equivalente a uma manchete do Correio da Manhã: faz correr tinta e gera discussão mas não explica nem resolve nada.

Há que ser exigente com Benfica e especialmente com quem o representa, mas também há que lutar por ele até não restar nada.

rsa disse...

Não percebo a fixação com o Barcelona,ok melhor equipa do sec XXI, como também o Milan foi a melhor equipa da decada de 90 no sec. XX são ciclos...

LFV é um mau presidente JJ um mau treinador?
Neste momento não sou fã de nehnhum deles mas depois da do que passamos na decada de 90 onde o fcp dominou a seu belo prazer do renascer das cinzas do grande Benfica ok ainda não tão grande como desejariamos...mas estamos no bom caminho.

Não percebo como hoje em dia os benfiquistas se dividem em pro e anti como se no futebol ou na vida houvesse uma verdade absoluta, um centimetro pode definir um campeão ou uma vida vejam o Europeu por isso deixem lá o Glorioso seguir a sua vida

Ginha disse...

Posso achar que o Benfica está ferido! Se achas que morreu, tens muito bom remédio... Mas fico a pensar que as palavras, o calor e o entusiasmo te atraiçoaram...

Bicadas disse...

O Benfica não compete contra um espelho.

É normal grandes instituições depararem-se com crises de identidade. É normal e cada vez mais, recorrente e incontornável. Há um breve texto de um livro de estratégia que chama a atenção para o facto de, das 100 maiores empresas americanas de há 60 anos, apenas subsistirem 25. As outras falharam no que há de mais fundamental: a adaptação.

O Benfica cresceu e ganhou a dimensão que tem numa época em que dispunha dos factores que lhe permitiam chegar ao sucesso. Hoje isso não acontece. Se virmos as contas da última liga dos campeões vemos que o Manchester United, apenas por exemplo, recebeu mais do market pool do que o Benfica recebeu na totalidade (25M€, contra 2,7M€). Isto sucede, essencialmente, porque o Benfica tem um mercado, a este nível, marginal.

Neste ambiente restam-nos duas hipóteses: cingirmo-nos à competição nacional contra os Pintos da Costa deste pardieiro e, mesmo tendo sucesso, definhamos; ou tentamos organizar o clube para que possa COMPETIR na Liga dos Campeões.

Na época passada muito se dissertou acerca da importância dos jogos com o Chelsea. A opinião mais veiculada pela blogosfera relativizava a importância destes jogos, identificando o campeonato como objectivo inalienável. Para mim eram os jogos da época. Perdoem-me uma perspectiva que considerarão herética, mas para mim valia mais a presença nas meias-finais da CL do que um título contra o porto. O Lyon ganhou 8 ou 9 campeonatos seguidos em França, mas a presença consecutiva nos quartos-de-final da CL é que o tornaram um clube respeitado.

Para mim o sucesso do Benfica só será verdadeiro sucesso se for incontestável, se for contra os melhores e não nesta chafurdice de liga.

Essa é que é a real essência do Benfica (para mim, claro está), e isso é que urge recuperar.

Cumprimentos

Vitto Vendetta disse...

Faço minhas as palavras do @dosul.

Anónimo disse...

Arre fodasse!

Unknown disse...

Compreendo as palavras do Sérgio. Compreendo mas acho que não são as mais indicadas.

Mas este este post mostrou algo que eu adorei ler. Os comentários aqui deixados, falo dos que li até escrever este post, os 5 ou 6 primeiros. Souberam ser grandes na resposta, não insultaram o Sérgio pela sua opinião, e souberam expressar sem precisar levantar pó. Muito bom.

Assim vale a pena, não só ler o post, como perder tempo a ler o que escrevem os Benfiquistas.

Parabéns a todos.

Abraço

Unknown disse...

Não concordo Bicadas, os campeonatos são a base sobre o qual se constrói o sucesso europeu.
Os 3 ou 4 milhões de euros que obterias pela passagem às meias, mais 1 milhão do market-pool que fosse e geravas por aí 4 ou 5 milhões adicionais.
A conquista do campeonato assegurar-te-ia que esta época não houvesse uma quebra muito grande nos cativos apesar dos aumentos, bem como um aumento significativo de sócios e vendas de camisolas e demais merchandising. O efeito positivo sobre o ego dos benfiquistas inerente a vencer o campeonato é muito superior a uma passagem às meias finais dos campeões e consequentemente as receitas reflectem essa preferência.
Acredito que à 3.ª ou 4.ª vitória seguida, o efeito vá diminuindo consideravelmente, mas tendo em conta o passado recente, um título é um bálsamo incomparável.

Já agora, para quem compara o Benfica da década de 90 com o Benfica da década de Vieira, que palmarés é superior ? Sejam sinceros.

Quanto ao post têm que perceber que o que o Sérgio fala, pelo menos pelo que entendi, tem a ver com a cultura, da exigência de valores, da democracia, da não veneração da figura presidencial acima de tudo o resto, do ódio primário ao Porto. Estas são as características em que o crescimento do Porto se fundou, o crescimento do benfica fundou-se em ser popular, não em ser para elites, em aceitar as diferentes opiniões, mesmo que se debatessem acaloradamente, não seguir a verdade una, o presidente ser o símbolo máximo do clube, mas alguém temporário, sujeito à crítica e que em caso de insucesso seria substituído por alguém que queria tanto ao clube como ele e como todos os outros, alguém ue nunca seria um abutre, mas uma águia.

Essa cultura, esse Benfica, está desaparecido desde os tempos de Vale e Azevedo e Vieira nesse aspecto é em tudo igual a ele (não estou a chamar ladrão ou desonesto ao Vieira). E essa cultura reflecte-se necessariamente no desempenho da equipa de futebol e a consequente falta de vitórias reais em vez de vitórias morais, ou de pré-época. Nesse sentido, o Benfica morreu, mais não é que uma pálida imagem do passado, uma cópia manhosa.

Mas Sérgio, tenho a solução, apoia e verás que tudo melhora.

Ricardo disse...

Germano, pelos 6 que aqui estão, muito dignos e elegantes, 15 foram apagados. 15 que basicamente falavam na mãe do Sérgio. E assim vai o benfiquismo...

Abraço.

Ricardo disse...

Sérgio, queremos que escrevas mais, tens muito a dar aqui ao nosso lugarejo.

Acho a tua visão demasiado radical, embora concorde com muito do que escreves. O Benfica - lugar mirífico no nosso coração - nunca morrerá. O Benfica desportivo, campeão, eterno vencedor, esse sim está adormecido. Mas pode ser que haja retorno. Não com esta gente, como está mais do que visto, revisto, comprovado e notificado em acta intelectual.

Unknown disse...

Ricardo, acho que está na hora de limitar isto a utilizadores registados que é para que fique imortalizado a cretinice alheia

Sérgio disse...

Primeiro, deixem-me concordar com vocês e dizer que provavelmente exagerei, fui demasiado radical, etc. Mas, apesar de admitir isso tudo, acho que muito provavelmente acertei. Falaremos daqui a 50 anos(quando já não for um exagero)… Mas quero vos perguntar, muito honestamente (não escrevam em comentário porque senão não vão ser honestos!). O Benfica de que o Mancini falava há um par de meses, ainda existe? Mesmo?

Rui Oliveira,
Quanto à questão do passado não era à BenficaTV que me referia. Faço minhas as palavras do BCool, que me entendeu se calhar melhor do que eu me soube explicar. A nossa genética está a mudar (ou mudou!) e não falo das vitórias. Falo de termos uma cultura de presidente-messias, de não existir Benfica para além dele e de cultivarmos o ódio e o folclore.
Quanto à comparação com o porto falo no comportamento do presidente, que, penso eu, só não fez mais merda porque o bufas não deixou. Sim, porque o benfiquista tem sido pouco exigente. Ou gostaste de ganhar um campeonato a ir jogar ao algarve com o Estoril? Qual seria a tua opinião se fosse o porto a fazê-lo?
O moleculasdeamor falou de uma coisa importante. Uma das razões que me levou a dizer que o Benfica está morto é a seguinte: Este presidente e direcção (que já fizerem muito pelo Benfica) neste momento estão a fazer-lhe mal. Onde estão os benfiquistas, os notáveis, os indivíduos de verdadeiro calibre para trazer o Benfica de novo a si próprio? É que se não existirem, se não há filhos do Cosme Damião este Benfica é mesmo dos filhos do LFV! Será o Veiga? Será que o futuro do Benfica são gajos que tenham um passado com o porto, casas do porto em Luxemburgo e tal? Não vos humilha isso? Que seja o veiga um dos motores da “resistência”? WTF! Se isto não é estar morto pelo menos é estar moribundo…
Do sul,
Essa do Barcelona-porto/Real-Benfica, que algo normal de se dizer não tem assim tanta razão de ser. O Barcelona tem uma história enorme e tão imaculada como um clube de futebol a pode ter. O porto é um clube que só existe na podridão, como os ratos ou as moscas. Nada a ver. De qualquer forma, e até te esclarece que costumo torcer pelo Real, do Barcelona aqui só me interessava a história e a identidade. Também há outra coisa que dizes e não concordo: Até posso ter exagerado, mas se gerar discussão já é positivo. Não há coisa que me interesse mais do que o benfiquista discutir e reflectir se o seu clube ainda lá está! Pode ser que acorde!
Rsa,
Sou verdadeiramente anti porque acho realmente que cada segundo conta e que cada ano que aquele homem lá continuar menos Benfica restará. Anti, anti, anti. Tens que me entender, demorei uns 7 ou 8 anos até ao anti…
Bicadas,
Muito interessante o que dizes. Acho que o Benfica, tendo no contexto europeu um handicap enorme no que respeita à capacidade financeira, teria que o compensar com uma identidade mais forte que os restantes. Daí o exemplo do Barcelona, que acho que não expliquei bem. A parte do sucesso catalão que me interessa tem a ver com a identidade do clube e a capacidade de formar jogadores que a entendem. Penso que o Benfica seria um clube onde isso poderia existir, onde poderíamos ter uma identidade e uma cultura (feita de presidentes, notáveis, ex-jogadores/treinadores) que nos permitissem formar benfiquistas, 7 ou 8 numa geração, que fossem verdadeiramente de craveira mundial e que pudessem marcar o jogo. É claro que teria de ter começado há 20 anos para existir hoje.
Sabinozé,
Arre.
BCool,
Eu apoio mesmo que pense que já morreu…nunca se acredita verdadeiramente na morte daquele familiar, right?
Ricardo,
No teu coração o Benfica nunca morrerá. Isso eu sei. Lá não há damásios, vales nem lfv…

JC disse...

Há muita mágoa nestas palavras. Infelizmente, também há muito de verdadeiro.

Abraço, Sérgio.

Observador nato disse...

Muito bem dito

Anónimo disse...

Desapareceu e muito lamentavelmente...

Sou Sportinguista nascido em 1980.

Ainda vivi a primeira década da minha vida a ver um Benfica assustador, pelo qual tinha um respeito imenso. Até porque, na altura, em Lisboa, Benfiquistas e Sportinguistas eram rivais e por isso respeitavam-se mutuamente. Além disso partilhávamos as mesas na escola o que nos obrigava a conviver.

Já na década de 90 conheci o meu primeiro portista, primeiro sinal da mudança de mentalidades, e o Benfica começou a cair, o Sporting já lá ia, mas os 3 ou 4 campeonatos que os encarnados ganharam fizeram com que o adepto do Benfica vivesse em negação, tal como o Sportinguista viveu nos idos anos 80.

O Benfica foi caindo e o adepto, foi ficando mais arrogante, porque vazio de grandeza. Agarrava-se a títulos como o maior do mundo e à "marca benfica" e foi por isso que o Benfiquista se tornou, não odiado, como pensam, mas sim um bocado semelhante àquela nobreza decadente já em tempos repúblicanos que exige direitos e tratamento diferentes.

Não tenho saudades, porque tenho medo, do Benfica, mas olho saudoso para aquele Enorme Clube vizinho que ainda conheci.

Anónimo disse...

o vieira conseguiu transformar um clube do povo num clube pimba!!