quinta-feira, 11 de abril de 2013

Amor

Ver o Benfica não é propriamente ver o Benfica. Os jogadores passam, passam os treinadores, até os Presidentes. Passa a vida dentro de nós. Há um benfiquismo que é nosso mas já é outra coisa. Eu fui do Benfica aos 3 anos, quando vi a minha primeira e única religião: o Estádio da Luz. Apaixonei-me tanto que no meu coração deixei de ter espaço para bispos, fumos brancos e derivações de crueldades ou imaginativas fés. A vida é isto que se passa agora aqui enquanto lês este texto ou acordas cedo e vais de metro para o trabalho. O resto, todas as ilusões em que tu queres acreditar, é um fim de bezana que invariavelmente acaba contigo ou a vomitar ou a dormir até ao outro dia no qual entrarás esquecido do que pensaste na cama, agarrado a uma almofada e a sonhos de resoluções que nunca farás porque, enfim, és capaz de ser humano.

Tenho aquela religião que sigo como peregrino devotado à causa: vou ver o Benfica, em casa e fora, todas as vezes que posso. E não vou mais, quando não vou mais, porque a vida, entre amores, cagadeiras e gastronomias, ainda dá algum trabalho. O que devia acontecer: ir a TODOS os jogos do Benfica. Cada jogo perdido é mais um conjunto de segundos que caem sobre o caixão e desenvolvem pó, larvas e mentiras que andamos todos a dizer uns aos outros, no meio de verdades que também dizemos uns aos outros porque, no fundo, até queremos manter um fundo de honestidade e outras virtudes esquecidas na passagem dos ponteiros do relógio. Que horas são?

Hei-de completar a madeira de carvalho com uma bandeira do Benfica e três ou quatro amigos a chorar atrás da carrinha funerária. A nossa morte é importante para os outros ou morremos tão sozinhos como vivemos? Quando me abraço e beijo os meus amigos num golo quase acho que não vou morrer. Ali, naquela bola que de repente (é sempre de repente) bate nas redes, eu sinto-me eterno. Sou uma criança, um adulto e um velho no golo. Perco o tempo, não sei do tempo, não há relógio que marque as horas do golo. No ecrã gigante, anunciam: 34´ Melgarejo, e sabe lá o Melgarejo o que foi correr uma bancada, chorar, cantar, gritar, morrer e viver naquele golo. 

Não sou católico, judeu, muçulmano, budista, cagalhão. Sou benfiquista. Chega-me bem essa imortalidade para saber que, no resto, posso ser um filho da puta tão triste quanto feliz por aceitar que a vida - tão agreste, colorida, bronca, deliciosa - é só o tempo que se intervala entre o meu choro de bebé e o dia em que cair de frente, em queda livre, para o mundo. 



7 comentários:

Morais disse...

É isso tudo e muito mais amar o BENFICA!!!

rui disse...

vez em quando sabes dizer umas merdas..Bom texto

Benfiquista Tripeiro disse...

Muito bem, é mesmo isso.

A minha mulher já me diz "hoje jantas, ou tens missa?"

Hugo disse...

Porra pá!

Já me fizeste chorar de manhã...

Pensava que o único choro do dia ia ser a alegria do golo em St. James Park...

NMO disse...

Milburn Stand A Paddock, Block L1C, Row KK, Seat 61.


CARRREGAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!

De Nottingham para Newcastle, do Hospital da Cruz Vermelha em Benfica onde nasci para o Mundo.

BENIFCAAAAAAAAAAAAAAAAA

João Bizarro disse...

Tá bonito

Ulrich Haberland disse...

Gosto muito, tens talento. Quando publicares alguma coisa avisa.