Confesso que enlouqueci. E confesso que vocês
enlouqueceram. Vocês, leitores; vocês, que adoram ou odeiam vir aqui ler o que
se escreve. E, no meio, quem definitivamente não enlouqueceu, foram aqueles que
precisamente por não virem aqui por amor nem por ódio souberam manter a lucidez
necessária. São poucos, quase nenhuns. Eu não sou um deles.
Há dois dias – ou ontem? – dei um giro pelas
últimas semanas de textos deste blogue e depois fui ler o primeiro ano de vida
deste espaço. Que diferença! Onde terá sido que uma decisão horrorosa –
mantenho o “horrorosa” porque me magoou muito, enquanto benfiquista -, a
antecipação de eleições, transformou a minha paixão pela escrita do benfiquismo
num lugar que desaguou nas últimas semanas numa autêntica loucura de indignas
discussões sobre o Benfica? Foi seguramente um trilho crescente, que se foi
apoderando dos meus textos enquanto lia opiniões que estranhava e não compreendia;
enquanto assistia a mudanças – de todos os tipos, mas sobretudo morais – na estruturas
genéticas do nosso clube.
Noto que sempre consegui tirar tempo para derivar
para o que realmente me fez abrir este blogue – a escrita da memória e sangue
benfiquistas em mim -, mas noto também que, insano, fui abdicando do prazer
para enveredar por uma espécie de luta absurda que, tendo sentido na
honestidade com que a cumpria, não tinha qualquer fundamento nem na forma nem
na necessária presença de espírito que deve reger um texto que aborda não um
qualquer tema quotidiano mas o mais importante dos assuntos, divinos ou
humanos: o Benfica.
Enlouqueci, confesso que enlouqueci. E confesso
que vocês também enlouqueceram. Fomos todos (quase todos) transportados para uma
placa giratória de insultos, ofensas, provocações, baixezas, indignas
afirmações e imbecis assertividades. Afinal, que merda de benfiquismo é o
nosso, que nem sequer respeita a opinião contrária? Um lugar de egos e
benficómetros, medições e analíticas suposições? O Benfica - o que eu idealizo
ou o que vocês idealizam (que nunca será o mesmo, porque nenhum Benfica é o
mesmo, depende de tantos factores e experiências, conhecimentos, emoções,
dependências afectivas) – merece mais, muito mais. Merece ser regado com
inteligência e massa crítica mas também com carinho e solidariedade.
Concordemos ou discordemos, mas façamo-nos todos um grande favor: amemo-lo na
sua grandeza e nas suas falhas.
As eleições acabaram, ganhou um dos concorrentes.
Eu não gosto do concorrente, outros gostam mais ou menos do concorrente e há
quem adore o concorrente. De uma coisa tenho a certeza: todos gostam do
Benfica. Tendo memória curta ou memória distante; analisando sob o prisma
desportivo ou sob o prisma financeiro; tendo medo do passado ou projectando o
futuro; suspeitando mais dos árbitros ou suspeitando menos dos árbitros; vendo
no vermelho um branco claro ou claramente vislumbrando no branco um encarnado
radiante. Todos - sem excepção - escrevem, pensam, comentam, reflectem, dissertam,
sentem, querem, sonham um Benfica melhor. E ninguém, no fundo, sabe exactamente
como consegui-lo. Temos, cada um, uma ideia; supomos que se fizéssemos assim é
que era; quase asseguramos que se formos por aquele caminho vamos vencer; às
vezes duvidamos; depois cremos. Queremos muito. Queremos tudo. Por uma razão
simples: queremos aconchegar o Benfica no colo e senti-lo tão nosso quanto o
imaginámos. Neste processo de intenções e sonhos, vamos em frente. Mas saibamos
também olhar o outro que vai ao nosso lado. Passemos-lhe o clube para as mãos,
deixemo-lo também brincar e dar afectos, sorrir com o Benfica nos braços.
Estou cansado da blogosfera. Mas não só da
blogosfera. Estou cansado da forma como o Benfica está a ser vivido. De um
lado, petardos; do outro, um Presidente que manda os adeptos para o caralho. É
pouco Benfica, compreendem? Estes são os extremos, precisamos de mais cadeiras
no meio. Pessoas que encontrem lugares de comunhão entre duas ideias contrárias.
Serão essas que levarão o clube a patamares de exigência que hoje
manifestamente não tem. E serão também essas que afastarão do Benfica a
oposição bélica. No fundo, no fundo, precisamos de gente boa, inteligente,
sábia (sábia de sentir, não só de conhecimento), honesta, credível, ambiciosa,
benfiquista. O clube merece mais de nós.
De modo que proponho um jogo. Não um jogo apenas
lúdico mas voltado para a construção comum de um Benfica maior e melhor. Na vez
de facções em lados estanques da barricada, proponho um quebrar de muros e um
encontro de sentidos. A princípio talvez fragilizado pelas guerras recentes,
mas que vá alargando a sua energia desde o ponto titubeante do recomeço ao
encontro completo de almas. Lembro-me de uma foto de dois amantes de mão dada -
ela na Alemanha de Leste, ele do outro lado. As mãos uniam-se por uma fresta
construída no desgaste dos anos e dos sonhos. Tanta gente sonhou que o muro
desabasse que ele próprio foi cedendo, devagar, aos braços em prantos de um
lado e de outro, aos gritos que uns e outros lançavam, aos beijos que juravam,
às preces que se atiravam contra o betão e paulatinamente o iam corroendo.
Primeiro uma fresta pequena; depois um buraco por onde os amantes e amigos e
família se tocavam; no fim, sem força para a divisão, as pedras grandes
espalmadas no chão e gente em cima delas, em abraços.
Na vez da fragilidade das propagandas, proponho a
força das ideias. Façamos, construamos ideias. E, porque elas podem surgir no
meio de escombros, usemo-las num jogo para não parecer tão sério. Então o que
pensei foi o seguinte: atira-se um tema para a mesa: sistema de votos dos
sócios; direitos televisivos; quotização e bilhética; estratégia política com
os órgãos de poder; solidariedade e Fundação Benfica; Casas do Benfica;
política de aquisições; modelo de formação; modelo da equipa principal;
discussão sobre o esquema directivo do clube, etc..
Cada vez que lançarmos aqui um tema, quem quiser
participar enviar-nos-á textos fundamentados com as ideias que têm sobre esse
mesmo tema. Dependendo do número de participantes, iniciaremos uma competição.
Chamemos-lhe, de forma um bocadinho tonta, a Champions das Ideias – se tiverem
nome melhor, agradeço. Imaginemos que 16 pessoas enviam textos sobre, por
exemplo, o sistema de votos dos sócios. Nesse caso, iniciaremos a competição
nos oitavos-de-final. Faremos 8 duelos, cada um com dois participantes. Cada
duelo será um post no qual aparecerão os dois textos que serão votados – e,
pede-se, comentados - pelos leitores de 0 a 20. Quem vencer, passa à ronda
seguinte, na qual terá de defender as suas ideias sobre outro assunto
relacionado com o clube. Se a participação for interessante, teremos não só uma
problematização dos concorrentes como dos leitores ao longo de várias semanas.
E, claro, nascerão ideias que podem posteriormente ser aproveitadas para o
clube. Se não forem, ao menos discutiram-se soluções e projectos. Ganhará
sempre o Benfica.
Vamos a isso?