É-me extremamente penoso escrever sobre o Benfica neste
momento por duas simples razões:
primeira, porque acabámos de perder mais um campeonato para o rival
nortenho. Segunda, mas não menos importante, porque não só perdemos o
campeonato da forma habitual - sendo prejudicados em momentos-chave da época -
como ainda o entregámos de bandeja devido a uma sucessão de erros (que também
começam a ser habituais) cometidos ao longo da época pela direcção e equipa
técnica, retirando força ao argumento de que fomos - e fomos! - seriamente lesados por factores
extra-futebol. Convenhamos que era difícil fazer tanta asneira junta em tão
pouco tempo, mas lá conseguimos.
O mais frustrante é que o desfecho, este triste desfecho,
era mais do que previsível. O Benfica desta época foi um Benfica enfermo desde
o início do campeonato – e, porque não dizê-lo, desde o campeonato passado - e
apesar do diagnóstico precoce ninguém pareceu muito preocupado em atacar a
doença de forma objectiva. Ao invés, enveredou-se pelo caminho do oculto, das
mezinhas, das rezas, da cegueira de uma crença infundada ou, se preferirem, de
um acreditar alicerçado em merda nenhuma. É bonito, é romântico, é quase
poético acreditarmos – e eu acredito muitas vezes - que basta que 11 gajos
enverguem o manto sagrado para que, como que por magia, o Benfica vença.
Contudo, é estúpido e pouco recomendável.
Por vezes dou comigo a pensar que a culpa desta crença
irracional é do antigamente. É que, olhando a esta distância, dá a ilusão de
que antigamente bastava isso para levarmos de vencida qualquer equipa. Parecia,
mas não bastava. O que acontece é que, em tempos idos, os 11 gajos que entravam
em campo com a camisola do Benfica não eram 11 gajos quaisquer. Nem sequer eram
gajos, eram senhores. E eram 11 senhores devotos do Benfica, prontos para o que
desse e viesse. Eram 11 indivíduos bem comandados – ou 11 líderes que pareciam
não carecer de comando - e que, em não podendo ganhar o campeonato porque
tiveram uma época atípica, não o entregavam ao adversário em Vila do Conde,
embrulhado com um lacinho todo catita e um cartão de felicitações. Podíamos
contar com 11 heróis com a perfeita noção daquilo que significava o símbolo que
traziam orgulhosamente colado no peito. Pelo contrário, nos dias que correm, uma
época atípica será aquela em que ganhamos um campeonato. Os nossos
ídolos-relâmpago chegam ao Benfica para tentar conquistar títulos mas sem se
esforçarem em demasia, porque isso é muito cansativo e pode originar lesões
aborrecidas que podem comprometer a tão ansiada transferência para um clube
milionário. E, se não ganharem, paciência: podem sempre dizer que os que
estavam cá no ano passado, e no outro, e no outro também não venceram.
Acharam ainda aqueles senhores de outrora e quem os liderava que o Benfica
estava destinado a grandiosos e repetidos feitos e, por isso, não perderam
tempo e puseram mãos à obra. Coube-lhes, então, a mais difícil tarefa de todas:
a de incutir no clube – em quem servia o clube - uma mentalidade ganhadora, sustentada num
vício de vencer como se este fosse uma necessidade básica para a sua
sobrevivência. E estavam certos, pois o Benfica não podia alimentar-se de outra
coisa que não fosse de títulos ou chamar-se-ia Sporting. A mentalidade
ganhadora, essa que tanto suor custou aos senhores de quem vos falei e aos
quais devemos o Benfica que todos amamos, de há 18 anos para cá que todos os
anos, todos os dias, a matamos mais um bocado. E o mais cruel de tudo será
quando ela estiver bem diante dos nossos olhos, já cadáver em avançado estado de decomposição, e não dermos por isso.
3 comentários:
Os meus parabéns.
É uma das poucas análises realmente lúcidas e objectivas que se encontram nos tempos que correm acerca do actual momento do Benfica.
Estou plenamente de acordo consigo: antes de qualquer outra razão para o insucesso, responsabilize-se quem não dá o que deve dar - leia-se, os jogadores, técnicos e dirigentes... - e quem não exige o que é obrigatório exigir - leia-se, os sócios, adeptos e simpatizantes.
É tudo isso, e o problema é que está à vista de todos, menos os que não quiseram ver, os que carregavam e que diziam que os lúcidos apenas fazem mal ao Benfica porque não apoiavam na net.
Vai na volta somos os culpados do Benfica ter apoiado aqueles que depois nos prejudicaram, ou das más decisões do Jesus, ou da falta de liderança do Vieira.
Incisivo e brilhante JC.
Mais do que acreditar na emergência de alternativas... acredito que as alternativas somos nós através de construção de ideias criativas e exequíveis...
E precisamos claramente de um treinador que ame o clube... e um presidente também...
abraço...
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